RAÍZES
Numa noite
O vento
Feito um açoite sem tréguas
Trouxe grito de forças
Que queriam varrer a Terra
Como se fosse a minha casa
Uma ferida
E a cidade,
Uma chaga pestilenta
Plantada sobre a pele do Cerrado...
Houve o medo,
O medo ancestral,
O medo visceral,
Vindo aos olhos
E eu pude ver,
Nos claros das vidraças,
O mais remoto de mim,
Ainda um quase bicho,
Achando o nascedouro de tantos deuses,
De tantas dores, horrores e ais...
Quem dera tivesse visto,
O tenro ver da consciência recém desperta
Na matriz humana ainda grotesca,
Nos clarões dos seus medos,
A serena verdade
Do saber de si
E o porquê dos seus olhos ver...
Tivesse não criado pelos ais
Da sua infante consciência
Tantos deuses, trazidos até aqui,
Em busca do saber de si,
E não veríamos hoje
Tanto horror nos Sistemas,
E tantas leis e filosofias, feito redes,
Para capturarem o seu Deus preferido
E, em nome deles, mantendo tantos vivos
Presos à multidão de mortos para alimentar
O poder da política-divina com o sangue
De novos e inúteis mortos...
Tão mais fácil seria
Que, talvez, o vento
Não tivesse razão
De querer limpar um cantinho da Terra
Da presença pestilenta
Da consciência que ainda não acordou...