DA AGONIA
Aos amigos Adriana Costa e Kolemar Rios, companheiros de muitas galas. Dedico.
(Viagem ao profundo de mim)
1 – O que serei?
Serei lagartixa eremita
Esmolando paga na porta do templo,
Ou um monte com estrumes de drogadas baratas,
Que pelo esgoto se fogem desembaraçadas
A fim de penetrar nalgumas pernas alheias
E tortas - o efêmero gozar?
2- O que serei?
Serei um astronauta africano,
Ou um internauta americano,
Que ao além sol se ruma átomo mediano
Proeza de brasileiro orando em tibetano,
Que não se coaduna com as astronaves
De um inventor cubano?
3 – O que serei?
Serei poeira ao vento,
Canivete de detento,
Ou raivas e mil contratempos?
O que serei?
Serei o não do máximo,
Uma vez que sendo sim no mínimo
Não poderei misturar-me ao ácido?
Ai! Qu’importa
A fúria dos loucos terremotos
Se ainda não possuo terra e nem moto,
Não atravessei o pantanal
E nem vivi o padecer de o breve viver?
4 – O que serei?
Serei requentada comida jogada aos vermes,
Agonia e dor de herpes,
Ou vis sustâncias sob sal e germes?
O que serei?
Serei o sim do mínimo,
Que ainda não poderei ser-te finado?
Se o serei o que não devo te ser?
Ai! Qu’importa
A fomedez dos ares metamorfados
Se ainda não tenho face e nem cheiro,
Tampouco transformei em estrangeiro
O vulgar gostar e o vil sofrer?
5 – O que serei?
Serei lixeira pública,
Retreta coletiva
Onde os famintos recalcados
Recatam-se no comer,
Ou serei intermináveis noites de solidão,
Que a cada minuto de vida
assiste emascular crianças e poetas,
Em nome da bondade
De o nosso senhor?
6 – O que ainda serei?
Serei novamente oxidado crucifixo
Colado à porta da igreja,
Ou serei exército nuclear de seitas materialistas,
Que ao homem se prendem
Qual cuspe individualista,
A cobrar dízimos de engenhosa antifé?
7 – Oh! Imã!
Oh! Imã de atrair sêmen ladrão -
O que ainda serei?
Serei perfume das fossas,
Ou serei tímida imaginação?
Serei contrapartida das rosas,
Ou serei lenta penetração?
Serei mordida das víboras,
Ou serei beijo de traição?
O que serei?