A loba errante

Ninguém jamais saberá

para onde caminhava a guará,

perdida no êrmo da madrugada

sem saber regressar à morada.

O seu predador motorizado

em um insensível enfado,

roubou-lhe a centelha da vida

que se esvai na profunda ferida.

Os olhos ainda cintilam,

em muda prece suplicam

por um conforto final

ao magnífico animal.

O dia que vai amanhecendo

ilumina o quadro horrendo:

ao vento, os pêlos dourados

emolduram dentes trincados.

O seu habitat, o cerrado,

em mares de soja ilhado,

não abriga mais a qualidade

de homens e lobos de verdade.

Brasília, 25 de junho de 2004

(Em memória de uma fêmea de lobo guará adulta, atropelada e morta por um veículo na via EPIA, em frente ao Parque Nacional de Brasília, às 5:45 h do dia 25/06/04, presenciado pelo autor. Não tendo sido recolhida até o final do dia seguinte, foi por ele sepultada no canteiro central da via)

Humberto DF
Enviado por Humberto DF em 18/06/2005
Reeditado em 23/01/2006
Código do texto: T25619