Amor Necrófago
Estenda-me tua mão
Como ao mangue,
Enlaça-me, lambuze-me
Com tuas manhas.
Faça de mim uma
Tua pústula preferida.
Onde alimentas teu gozo?
Onde, em mim,
Buscas teu quinhão de fel?
O botulismo desregrado
Em tua fome,
E mordes e dilaceras
Minha alma andrógina.
Com tuas raizes
Ceifas-me a seiva
Dum apostema creófago,
Carnívoro, cansado,
Bibelô da carne,
Adorno inócuo, sofrido.
Vamos morrer juntos
Num falecer constante e podre
Pelas valas únicas, úmidas
Das ruas espectrais
Que desaguam na praia,
Onde pedantes casais,
Amantes de valor contado,
Deleitam-se numa necessidade
Vil, doce, escarnada.
Leve-me à ginofobia
Falsa e hipócrita
Da fidelidade tosca,
Com versos escandidos
De teu doentio ver,
Teu tracoma vigia,
Tua razão, teu ciúme.
Com tuas bocarras
Cape-me o desejo viscoso
Dum lascivo priápico
Em redundantes partidas,
Sucessivos saques sazonais.
Seja algoz infecciosa
E serei réu putrefato,
Condenado morfético
Em tua necrópole rala,
Rasa, comum,
Até que a morte nos separe...