Esmola
Veja, senhor, pois vossos olhos não mentem,
Que nestas mãos já se assomam montanhas
E se rasgam fendas por labutas tamanhas
E não calo a fome que estas crianças sentem.
Um magro tostão apenas vos peço, doutor,
Pois desta maldita terra nada se tira
E a chuva não desce, parece de birra,
Jocoso céu de tão pueril torpor.
Não me recordo à quando larguei o trago
E pelos pequenos até lancei-me em romaria,
Rogando um pouco d´água que esta bastaria
Para regar o grão, e do grão colher o fardo.
Valei-me, senhor, de uma humilde moeda
Que vossa algibeira nem sente a falta.
E essa bondade vos guardará a virgem sacra,
A compadecida que a nenhum filho renega.
Minha companheira se foi pela peste carregada,
E pelo passo do andor, logo serão os fracos,
Sebentas criaturinhas ainda sem pecados
Que talvez matem a fome com a morte anunciada.
Veja, senhor...
Mas vossos olhos não sentem....