Ruínas
Bem perto da minha casa existe um castelo,
ruína antiga da fidalguia,
com grandes salões
outrora decorados com ricas tapeçarias,
quadros renascentistas
e toda ostentação do império;
brasões europeus,
quartos cortinados de sedas e rendas
cristais da Boêmia e enormes espelhos
que refletiam as cabeleiras nobres.
Hoje, em suas ruínas,
por entre ratos e insetos,
destroços fétidos e restos de comida,
espalham-se caricaturas humanas,
mendigos, marginais,
sombras de homens-animais.
Seus salões são hoje descorados,
assombrados por fantasmas vivos
que amontoam-se sobre os monturos
roubando espaços.
Seus quartos são refúgios
de famílias inteiras,
crianças famintas, mulheres imundas, homens bêbados.
Suas varandas de grades traçadas
onde a nobreza mirava o mar e o horizonte
são hoje destroços
onde olhos sombrios e sem perspectivas,
sem horizontes ou mar
nada têm para olhar.
Bem perto da minha casa
existe um castelo
que um dia já foi assombrado
pelo tempo e pelo passado.
Hoje, diante da miséria,
da fome e dos ais
os fantasmas fugiram
e não assombram mais
deixando o terror no presente
na figura de tristes mortais.
Rio de Janeiro, 29/01/1985
* Não sei se este castelo ainda existe, ficava no Aterro do Flamengo e era presente em meus sonhos e pesadelos. Provavelmente foi demolido para dar lugar a mais um prédio de luxo. Seus moradores? Provavelmente sob pontes, marquises e viadutos.
Mauro Gouvêa