Sozinho Com Todos

Eu deixarei este corpo com fúria

a terra diminuirá essa massa de poeira e ódio acumulada

que um dia desejou ser o ocaso

de um adeus precipitado.

Meu corpo

se eternizará em uma maldita fotografia,

partículas de poeira tomarão conta de tudo

que antes fora peso,

palavras ditas a mesa do jantar.

A leveza será como uma amante

de pernas para o ar.

Sem sombra de dúvida

alguém baterá a porta,

pela manhã

a solidão se arrastará sozinha

como um fantasma

e se unirá a mim

e nós discutiremos no café,

bateremos boca sobre as banalidades das horas

e finalmente nos separaremos.

Mas, com grande alegria

apertaremos as mãos

como antigamente

e abandonaremos nossas casas.

Eu estarei diante de uma folha em branco,

a terra não será o eco

nem o homem um fantasma de cajado;

pelos quarenta anos

cem verões terão se dissipado

numa só golfada:

eu terei esquecido o calor,

seguirei amando o estranho que eu mesmo fui.