MINHAS CALCINHAS
Lílian Maial


Minhas calcinhas são como eu:
inesperadas,
surpreendentes,
velhas conhecidas...

Não há nada nelas que chame a atenção,
sejam de seda ou de algodão,
tanguinhas ou calçolas,
afinal, eu sou a dona...

Há, no entanto, algo incomum:
são cheirosas, de um cheiro terra,
de um cheiro chuva,
de um cheiro mar.

Bordadas de desejos,
confeccionadas de carícias,
do formato dos olhos que as desvendam,
abrigam a pureza de um segredo de amor.

Podem ser retiradas delicadamente, pela pele úmida,
arrancadas com o furor da paixão,
ou ficam ali, bem quietas,
testemunhas mudas do vulcão.

Minhas calcinhas têm lugar cativo,
gaveta da beleza,
armário dos sonhos,
envoltas no fascínio do fetiche.

Têm ciúme umas das outras,
disputam a vez,
e toda vez que as procuro
olham para mim com avidez.

Coloridas ou não,
uma para cada ocasião,
prontas para as sensações,
absorventes dos meus choros e canções.

Calcinhas de renda, veludo, cetim,
ou de pano simples,
sem graça e sem fita,
pros dias sem festa, sem boca e sem mão.

Mas podem ter gosto,
sabor diferente,
morango ou pistache,
chocolate e cereja.

São todas tão minhas, tão caras, tão sóbrias,
que mesmo sem elas, estou bem vestida.
Se eu ando, ou se eu danço, se eu sento ou se eu deito,
emanam um encanto, meu traje perfeito.

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