Arbítrio
Entraste pela porta,
agora sais pela janela.
Entraste majestático pela aorta
quando me envenenaste
de histórias de reis, dragões, donzelas
mas a espada nua agora corta
e das veias me sais feito sangria;
Podias teres sido muito mais
qual óleo sobre tela; tu, porém
esbatida aquarela já sem pátina,
desmoldurada, sem textura, vazia,
não passas de figura quixotesca
ou de dantesca criatura – pesadelo
de onde escapo suando cada poro
quando mais te deploro o desmazelo.
Como bálsamo (fingias!) tu vieste;
agora és a peste de que fujo.
Dei-te a aurora da vida, inconteste,
mas fizeste de mim teu jogo sujo.
Entraste pela porta – sim, eu sei!
Mas, agora que te vais feito sabujo
atrás de outra cadela que te baste
escolhe: ou saltas da janela
ou enfrentas a arma que compraste.