Sob o domínio do medo
que grande sensação
o medo
ele te toma por inteiro
e sem preliminar
é como um beijo forçado
um puxão pelo braço
uma boca te sugando o ar
o medo de ter medo
do qual falou Renato
que é um medo agigantado
do não visto e não falado
é o medo de ir e não voltar
o medo são palavras inteiras
grandes, algumas meeiras
ditas sem titubear
não vale a pena escrevê-las
nem mesma as recitar
medo é rima fácil
rima com dedo
em riste, no meio da cara
ou no gatilho
com trocadilhos e eufemismos
é a ameaça que não quer cessar
o medo é dedo na ferida
na chaga aberta, memória viva
de gente que viveu um sonho
de liberdade sem medo
e morreu cedo
em meio ao sangue e o medo
mas é segredo
não se pode contar
o medo tá na esquina
tá surdina
tá na janela a bisbilhotar
tem o medo brutamonte
e tem o medo pequenito
tem o medo ainda não nascido
e o medo que morreu e quer voltar
o medo dá nó na garganta
e também chave de braço
e te empurra de lado
o medo atira pra matar
e se a bala não mata
o medo vai de porrada
pau, pedra e faca
"é pra bater até derrubar"
primeiro o medo te abraça
daí te paralisa e te arrasta
pro quarto escuro, nos fundos
de um endereço sem casa
o medo tranca a porta
e sem voz e sem mão e sem boca
se apossa do meu eu-corpo-em-vão
o medo é uma coisa
ou seria coiso?
que troço doido
um neologismo causar medo
aqui e acolá
mas uma coisa é certa
com ou sem medo
o fascismo não passará