A Pescaria

O barco ancorado e o olhar fixo

nos movimentos da linha

não me conduzem a pensamento algum

quero apenas fisgar o peixe

e fugir do mundo...

Observo atentamente os movimentos da linha

se vacilar, o peixe escapa

se fisgar, puxo-o para fora d'água,

coloco nova isca e novamente

me ponho a observar os movimentos da linha

e esqueço o mundo...

Quero peixes, muitos peixes,

embora os tenha de sobra,

quero mais, não paro,

se paro esbarro no mundo...

Esbarro em pensamentos.

Não, prefiro pescar até o cansaço

tomar conta do meu corpo

(ah este corpo, não sei onde colocá-lo).

Quero peixes, milhares!

Pescar até esgotar as últimas energias

e deixar a cabeça tonta, alheia.

Depois dormir

um sono profundo, ininterrupto, sem sonhos

e no dia seguinte voltar à pescaria,

ao barco ancorado, aos peixes,

longe da vida, dos homens,

longe do mundo...

Poema do livro Três Estações - edição do autor - 1987