Como me nostalgia o mundo não-fatídico

Como me nostalgia o mundo não fatídico!

Como me nostalgiam paisagens pintadas com a inocência fantasiosa da velha infância!

Como me carecem os infinitos cenários perfeitos e inexplorados!

Careço-me.

Vivo no mundo dos números palpáveis e das palavras concretas.

Paisagens são coloridas sem pincéis e aquarelas

Cenários são círculos que possuem arestas e caravelas.

Não nutro mais a beleza quase impossível da realidade

Sou fotossíntese das árvores que me cercam e me odeiam; não mais posso enxergá-las

Não possuo amor por devaneios prazerosos,

Minhas divagações habitam apenas o reino do desprazer.

Sou da terra,

Entre raízes, a terra não me é

Da terra, existo sem ser

Existo sem ser.

Na infância perecível, o existir me era alheio

Pela ausência da perene consciência,

Pelo carecer de úteis pensares.

De que me serviriam?

De que me servem, hoje, diante da inutilidade de sua própria utilidade?

A inutilidade de sua própria utilidade

O não-ser do próprio ser

A desafirmação da própria afirmação

Bicho não é ser bicho e talvez essa seja a verdade do mundo.

Flor não é ser flor e talvez essa seja uma verdade a mais.

Bicho e flor só existem na desrealidade dos apenas humanos.

Queria de volta o tempo em que bicho era meu corpo

E flor era meu coração

Agora meu corpo existe pois é peso;

Meu coração, porque palpita.

Amélie Chamborro
Enviado por Amélie Chamborro em 20/07/2019
Reeditado em 20/07/2019
Código do texto: T6700392
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2019. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.