DÉCIMA INCONCLUSA AOS RECUERDOS

Confrades de rimas rudes ,

Tupã foi berço divino

pra quem aprendeu a cantar

com claves de vento e rio

pois, a Mãe de Deus abençoou

as águas do Toropi

meu rio irmão peregrino

que serpenteia na serra

pra se espraiar vagaroso

pelo verdor dos varzedos.

Irmandade combatente

de noitadas mal dormidas

onde as guitarras assombram

os fantasmas que trazemos

e o poema toma forma

do coração do cantor;

peço permisso e tenência

pra o verso sem pretensão

que vem com cheiro de poeira

de tanto cortar estradas.

O amor desenfreado

acendrado , impregnado

no corpo e alma da gente

pelo verso de tiro largo

nos fez assim , companheiros

irmãos de noites insones,

das horas boas e tristes

se é que existe tristeza

pra quem canta de alma aberta,

alpedo , empilhando rimas.

Quando o passado desfila

no potreiro das lembranças

um corolário de imagens

vem adornar a existência.

Uma silhueta brejeira

com crespos em desalinho

habita pelos recuerdos,

como se fosse um fantasma

que em brumas envolto vem

inquietar as madrugadas.

Malabruja, um mouro negro

calçado nas quatro patas

frente aberta, marchador

me traz imagens distantes

de campo , gado e mangueira

sem olvidar os passeios

ao trote sem muito alarde

quando em pilchas de domingo

rumbeava ao rumo do povo

negaceando algum romance.

Talhada aos cinzéis dos ventos

no topo de um plaino grande,

a cidade donde eu vim

que vista assim de relance

nos dá ligeira impressão

do tempo não ter andado.

Engano, são fantasias

quem chega é sempre um menino,

quem parte um homen curtido

pelos repechos da estrada.

Nas ruazinhas estreitas

parece ainda viverem

incontáveis personagens

que me povoaram a infância.

Um louco trançando notas

num canto de rimas pobres,

um andarilho, um ginete

e um gaiteiro repontando

uns casais desparceirados

na casa da “Carreteira”.

Num bolicho de arrabalde

de variado sortimento

um rádio marca “Mundial”

entretinha a parceria,

com toadas e milongas

entre chiados e reclames.

Vez por outra um trovador

desencordoava da idéia

um versejar bochincheiro

numa sextilha campeira.

Nas horas lentas do mate

a tropilha dos recuerdos

vem pastar a tenra grama

dos varzedos interiores.

O poema brota rindo

como vertente de cerro,

como cascata de arroio,

para encerrar no piquete

essa potrada gaviona

que dispersou-se a lo largo.

Bem mais tarde , sol se pondo,

chegada a boca da noite,

as sombras fazem do rancho

uma ode à solidão.

Volto dos longes que andei

em meio ao canto dos grilos,

tento cerrar esse poema

nessa décima inconclusa

deixando aberta a porteira

para os recuerdos voltarem.

moises silveira de menezes
Enviado por moises silveira de menezes em 07/11/2005
Código do texto: T68307