Corona, coroando uma verdade antiga

O chão é batido,

Apenas uma divisão,

Rostos sofridos,

Vivem nesta habitação.

Pode se chamar de casa,

Mas não de lar,

De longe a alegria passa,

Tudo é sofrimento neste lugar.

Uma mesa com panelas vazias,

Não há o que comer,

Aqui, só se passam os dias,

Nada diferente vai acontecer.

Trabalho não existe,

Só desemprego,

Mas a vida seguir insiste,

É necessário ter dinheiro.

E não vem a ajuda oficial,

Que nestes tempos de pandemia,

Deveria ser algo natural,

Mas é só espera e agonia.

Um cão dar um latido,

Pulo um canal fétido,

Foi o aviso, eu podia ter caído,

Acordei do torpor trépido.

Porque enxerguei crianças que brincavam,

Naquela água que mais parecia chorume,

E nessa mistura pueril, meus olhos atinavam,

Que as suas inocências dessa água eram o alume.

Um homem um cigarro entre os dedos,

E com um copo de bebida na mão,

Olha para mim com seus olhos acesos,

E faz a seguinte indagação:

"Moço, o que é pandemia?

Escuto por aí pessoas dizendo,

Que muita gente está morrendo,

E que já chegou na periferia.

Pergunto porque talvez,

Seja uma opção,

Para resolver de uma vez,

A minha situação,

Olhe, não preciso de caixão,

E nem jazigo em cemitério,

Eu estou falando sério,

Porque desta vida não sou pelego,

O que foi que ela me deu?

Fome, sofrimento e humilhação,

Trabalhei tanto com essas mãos,

Que em cada calo enxergo Deus.

Ah moço, a sua doação,

É bem-vinda na minha casa,

Mas não resolve a minha situação,

O que resolve é uma cova rasa,

E como um favor derradeiro,

Peço que diga ao coveiro,

Que no lugar que me enterrar,

Bata bem a pá em cima da terra,

Para dura e lisa ela ficar,

E não bote cruz e nenhuma marcação,

Porque essa vida nunca existiu,

Sou um órfão desta nação,

Sou um Zé Ninguém do Brasil.

(Fui com um grupo de pessoas numa comunidade na periferia de Recife, para levar doações e me deparei com muito sofrimento. Estas são as minhas impressões a respeito de um diálogo que tive com um morador do local.)

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Interação com o mestre Jacó Filho

Verdade diluída,

Não tem espaço nem tempo...

Com todos me arrebento,

Com impostos só de ida...