PREMATURA

Guardada

na timidez da pura infância,

ela, menina, desbotou da palidez.

Deixou de pedir tantos porquês

Borrou as unhas de esmalte aflito

Marcou as costas no apertado sutiã.

Avermelhada,

teve vergonha do primeiro beijo

de língua enamorado.

Desconcertada,

ajustou o corpo à toalha de banho

só por pudor do meu olhar aberto.

Deixou de temer os velhos trens-fantasma

assustadores dos parques de diversões

Sem perder o sotaque, os cacoetes, o dialeto do pê,

falou como se nunca tivesse tido a língua presa.

Chorou com a caixinha falando música em vão,

que ainda toca quando escorrega sua mão.

Quase adulta, sem perder a sensibilidade de menina,

escondeu sua boneca com corrimento na vagina.

Cresceu sem namorar direito e sem adolescência,

pois, aos dezesseis, pariu um boneco de carne.

Em busca de vida e vida, sem a intensidade dos porquês,

aprendeu a rodar piões para o filho que lhe pede mão.

Viveu conformada com o que a pouca infância lhe deu:

caixa de música para ouvir, uma boneca para cuidar

um filho para criar até que a vontade de amar não adormeça;

enquanto isso, no último beijo prematuro, acordo a menina.