Sobre pais e filhos

Lua-mãe —

Avoluma na pele do silêncio,

Matura em sombras o que não se diz,

Abate o cio das águas gentis,

Suaviza o sal com mãos sem intento.

É ventre de prata em combustão lenta,

Que coteja memórias e acalenta

O hálito úmido do esquecimento.

Sol-pai —

Arde no peito do tempo cinzento

Um fogo que cura, outro apenas some.

Semeia auroras em pedras sem nome,

E devolve calor ao rebento,

Mas quando curva-se, o dia se vai,

Sua luz dourada, que em si subtrai,

Evapora num mistério sedento.

Terra-filha —

Ah, por que te afastas, órfã de abrigo,

Na noite escassa que sussurra ausência?

Os olhos negros não espelham o pai.

Seiva branca que perdeu toda a essência,

Vida, que pulsa em tua carne, trai.

Chora no sepulcro a dor da decência.