Nunca

Nunca ninguém me deixou com água

na boca

e a goela,

ressequida, quase oca.

Nunca uma moça

tão bela

quanto louca

atormentou tanto minh'alma

a esta altura da vida, calma.

Nunca uma linha tão tênue

dissipou gigantescas labaredas.

Sombreadas, as veredas

da paixão, pela consciência pudica.

Nunca, de uma hora prá outra,

uma conversa despretensiosa

transformou-se numa relação maravilhosa,

quase colorida.

Nunca em tão exíguo interstício

de tempo

o feitiço removeu o terreno

que existia sob meus pés.

Nunca em questão de horas

contínuas

o tesão enrolou-me minha língua

e deixou-me em cólicas uma mulher.

Nunca na história dos homens

o quase se fez eternidade

e o excesso de juízo, a brevidade

de algo que se me apresentou eterno.

Nunca exsurgiu tão extremo

o litígio

entre o pecado e o pudor

e o prazer, coitado, meu senhor!

Sufocado, por ambos, a ver navios.

Nunca na minha vida,

de mão beijada, a acaso

trouxe-me relação tão intensa!

Não fosse o capricho, propensa

à amizade, feito arco-íris, colorida;

Nunca, Deus, nadei tanto prá me afogar no raso

do quase!

Pasme...

Cid Rodrigues Rubelita
Enviado por Cid Rodrigues Rubelita em 03/03/2006
Código do texto: T118138