Alquimia
"As palavras, como imensas águias, voam
E às vezes pousam."
Também meus pensamentos voam
E te levam em suas invisíveis asas
Por todos os cantos da casa.
Tais as palavras, o amor
Por que não voar?
Todavia, é ser teimoso e quadrado
Dentre as paredes do peito vive agarrado
A um coração pusilânime e alquebrado,
Não voa, não voa.
Nem se aquieta,
Este ladrão inimputável
De minha paz plausível
De minha respiração rarefeita.
Por que o ser não tem o poder
De se transformar,
Ao invés de sonhador,
Assim tão adrede ao contexto poético?
N’um altivo lutador
Análogo ao do Drummond,
Que sempre era o vencedor
Na luta diária com o léxico?
Ou então em condor
Que, pelos quatro cantos, voa
E vive, a cada dia, mais completo,
Totalmente alheio ao amor.
Mas a gente corre, foge,
Pelas ruas, se dissolve;
Uma fuga em vão
Do contumaz inquilino.
Companheiro de sala,
De bar, do destino.
A não ser que se arranque o coração
Seu fiel e habitual fiador.
O amor é indissolúvel amálgama
Deste corpo já exaurido.
E eu, por que o não dissipo
E jogo no mar as chaves desta casa?
Ao contrário, nas marginais
Das iluminadas avenidas
Contando os autos velozes
Gasto noites veladas
De volupiosas vozes
Que passam por mim nestas horas tristíssimas.
Na vida, apenas pro nosso ego
Somos insubstituíveis e belos;
Às pessoas, vezes pouquíssimas.