Um ser querubim

Somente estás disponível para mim,

isto é, comigo tu te importas,

agora que as ruas de tua cidade jaz mortas;

instante em que reclusa te lembras de mim

e com virtual displicência entras em órbita

à caça de minha figura torta;

ainda assim meio indisposta,

como se eu estivesse à sua volta,

como se eu fosse um ser querubim.

Mal sabes tu que o ramance,

feito lavoura em terras arenosas,

tal plantio de delicadas rosas,

carece de seiva e afeto abundante.

Corres para meus braços e te dizes liberta,

agora que estás sem companhia para as festas,

agora que feneceram as flores de teu jardim.

Teus ares de abelha-rainha saíram de moda,

agora que troquei a chave de minha porta,

agora que perdi a auréola de querubim.

Mal sabes tu que até a eternidade

tem um marco inicial de finitude

e que é em cada fração de atitude

que reside o ar renovável da felicidade.