A um passarinho

Salvo da boca do gato,

Ganhou gaiola, paninho,

Grão triturado, água, mamão.

Três vezes no dia

Vinha a mão-passarinha

A dar-lhe calor,

Comidinha. Um dia

Até minhoca ganhou.

Cantou respondendo ao chamado

Da mãe. Esvoaçou.

Machucou o bico,

Que a mão tratou.

A mão cantou,

Mas não era canto de mãe,

Era só canto improvisado.

Batia as asinhas,

Firmava as perninhas,

Às vezes fechava os olhinhos,

Dormia, ao invés de comer.

A mão paciente

Esperava, insistia;

Ele abria o biquinho

E engolia com sofreguidão.

Foram três dias

De tentativas:

Veio a morte e o levou.

A mão entristeceu-se

E se fechou. Depois

Abriu pequenina cova

E o passarinho enterrou.

Vida frágil,

Não conheceu a brisa,

O sol; não alçou voo,

Não ganhou liberdade.

Deixou no ar a lembrança

De um biquinho se abrindo,

Uns olhinhos dormindo

No quentinho da mão;

Uns pezinhos firmando,

Querendo viver.

Vai, passarinho, voar

Pro Norte, pro Sul,

Na imaginação, no papel,

No céu de passarinho

Feito com enlevo,

E dedicação

Na infinita página azul.

Neusa Storti Guerra Jacintho
Enviado por Neusa Storti Guerra Jacintho em 26/01/2009
Reeditado em 29/11/2009
Código do texto: T1405241
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