Caído
Houveram dias que dormia pra não viver
atirava-me aos braços de Orfeu
e lá nas profundezas dos sonhos eu vivia.
Sabia que nada ali era real, porém
nada me machucaria no outro mundo
ninguém jamais iria tão fundo.
Depois de horas e horas eu despertava
então vagava pelas ruas feito morto-vivo
mais pra lá do que pra cá.
Procurava anestesias pelos cantos
dos bares e becos escuros
procurava no lixo resquícios do Sonhar.
Claro, nada encontrava
então me perdia tentando seguir
o rastro branco no céu de azulejo.
Quando a noite terminava
amanhecia o caminho de casa
e querendo morrer eu dormia.
Depois de um tempo pouco restou
daquele mundo de fantasia depressiva
e os dois mundos agora se equivaliam.
Acordado, lutava pra não dormir
e dormindo, lutava pra não acordar
e no final das contas, pra mim já não havia mais lugar.
E logo veio o dia da decisão:
atiraria-me no Hades, levava um par de moedas
o barqueiro haveria de me levar.
Mas no último momento ela veio
espancou minha janela, invadiu minha casa
estapeou minha cara e me envolveu em suas asas.
Me arrastou pra longe da beira do Aqueronte
me pediu que fosse forte
ficasse e a amasse.
Consenti, tentaria de novo
voltei à vida por ela
então fizemos amor como deuses
Para espantar a Morte.