Augusta (In-Dependência)

O acordar ressacado de relógio adiantado

a hora da ida, que passa

a condução perdida me leva a encontros esperados

encarar a metrópole em boa companhia

é quase melodia para ouvidos desesperados

e chegar lá a tempo seria especial

pra quem sabe como é duro correr na direção certa

mas chegar atrasado.

eu quase sempre chego atrasado.

Na marginal penetramos a garoa

meus pensamentos tentaram correr

em direção a garota mas ela fugia

não, na verdade ela não existia ali ao meu (não) ver

eram apenas eu, dois amigos e suas amigas

jovens demais pra uma brincadeira

cara ou coroa

- gato mia?

miau.

O ônibus para e dispersa minhas visões

de menino mau, e na estação o tempo ainda corre

enquanto na Paulista uma alemã vem em rota de colisão

eu não desvio e ela quase me abraça

I'm sorry em uníssono e depois um sorriso

ruborizado e ela segue e eu não consigo

entender o porque de olhos tão azuis

me fazerem sentir como se algo tivesse congelado

aqui dentro.

Mas talvez isso fosse só o vazio do vento

frio que deixa meio londrino o clima do centro

e descendo a Augusta a única Heineken do dia

descia amarga e gostosa garganta abaixo

enquanto meus Free's iam incendiando

me fazendo de capacho, uma espécie de escravo voluntário

soltando fumaça eu pensava em como seria John Lennon

comemorando o septuagésimo aniversário

mas lembra dos ponteiros, e meu problema com horários?

Chegamos e não havia mais celebração, pessoas voltavam

ainda de longe vejo a garota, ela sorri em nossa direção

eu tento uma cara que suporte o desapontamento

desisto, assumo a decepção e aperto mão por mão

das pessoas que a garota nos apresenta

novos amigos, novos amores

novos (nem tão?) conhecidos

alguns pareciam divertidos, outros não

alguns pareciam réplicas de gente que eu já havia esquecido.

A missão agora era afogar o resto de feriado

em um mar de cervejas em qualquer um

daqueles bares de esquina

e de volta a rua Augusta observei os paulistanos

cheios de efusividade, meninos e meninas

com ares da carência típica das pessoas da cidade

e logo as duas tribos estavam ali, quase misturadas

enquanto eu girava por todos os lugares feito um Pete Doherty

tendo crises de abstinência.

7 de setembro, dia da In-Dependência

a garota me cede um cigarro, paga a cerveja

e desaparece com competência, eu agarro outro copo

fechos os olhos, sinto o cheiro da garoa

e quando os abro novamente, de súbito

tudo parece um tanto diferente

eu já não sinto nada

nada, fora sede.

Posicionado estratégicamente no centro da mesa

revezo entre as marcas de cerveja

o papo continua, o céu escurece

Pedro, Ju e Ademar continuam no triângulo

que não dá nem desce

a parte paulistana cogita um cinema

mas já era hora de voltarmos

no fim, cada um pro seu lado, sem problemas.

Subo a rua disperso em todos seus sons.

No caminho, ambulantes fogem do rapa

e no metrô ríamos cansados e satisfeitos

lembrando do show que não vimos

e dos travecos e dos garçons e das putas

e dos olhos azuis perfeitos

na estação, esperar foi o de menos

a brisa chegou antes do ônibus

graças a uma pequena dose do doce veneno

- veneno, não! medicina alternativa!

E com a cabeça ativa no caminho de volta

deixo um sorriso de leve no rosto, em minha boca

eu sinto o gosto agradável da bala de morango

Pedro cede, Ademar segue Ju que não cede

Lindsay não cala, o trânsito segue lento

a outra garota me olha, pensa, mas não fala

enquanto persigo as luzes lá fora

minha mente lança perguntas ao vento, como

Se o Amor existe, quanto tempo temos fora o agora?