Teu corpo é meu misterioso sol

Bem sei que o teu amor é menos absoluto do que a morte,

Mas sei que teu amor é mais profundo do que a vida,

E é preciso que eu vá embora, pois nesta serenidade

A traição dorme como um lago espesso a sombra imóvel!

Ouça esse silêncio onde a essência de todos os gestos

Já parece esgotada e onde as asas do sono vão se alongando.

Vede as formas eternamente imóveis onde outrora

Mãos úmidas de beijos, como flores desmaiadas pelo calor,

Acendiam no crepúsculo das cortinas o odor evanescente do pecado.

Deixa-me partir em paz, ouve este apelo que desce como punhal

Na carne branca de todos os silêncios cheios de pavor e de amor.

Ouve, por favor, antes que eu odeie estas mãos que trazem nos dedos

O perfume indelével de tantas alegrias consumadas e saudosas,

O perfume que rodeia a forma de teus belos seios graciosos

como duas rosas adormecidas nas primeiras sombras da noite.

Se ouvisses esta voz que me chama e que é como o arrepio

Daquele que no fundo da carne sente passar o olhar de Deus!

Se ouvisses essa voz, tu fugirias de mim porque o teu amor

É como o raio aceso que grita na força das tormentas,

E depois se extingue como a luz de uma estrela que tomba do céu,

Deixando atrás de si todo o silêncio demoníaco do Grande Deserto.

Como não maldizer esse sortilégio que aos poucos consome

[a chama viva de nossa existência!

Como não dizer, diante de tudo o que nos cerca e traz no olhar

[o signo da morte e enche de beleza e tristeza todas as coisas?!!

Flores! Pobres flores molhadas que o tempo um dia soprará

Nos caminhos como frutos espalhados e esquecidos na tempestade,

Vós sois a longa flora onde o nosso desespero se consome e se reaviva!

Meu Espírito vê com o olhar que desce até o fundo do Abismo

A Indiferença que cresce como a luz da lua na madrugada

E envolve o astro cansado do teu corpo: astro mortal e falho,

Pois teu corpo é meu misterioso sol nascido como um lírio sagrado.

[Tu foste concebida na escuridão grávida e pura de minha Vida!

Gilliard Alves
Enviado por Gilliard Alves em 30/01/2021
Reeditado em 30/01/2021
Código do texto: T7172466
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