DUVIDO...



Duvido que um poeta seja mentiroso a ponto de enganar a si mesmo, inventando coisas que ele não sinta.
Acho que um poeta é alguém especial, sincero, com alma sensível e que vê o mundo, não por uma lente, mas com os olhos do coração.
Duvido que um poeta seja ganancioso e egoísta chegando a vangloriar-se das tragédias humanas para escrever. Ao contrário disso, o poeta escreve sobre a vida, sobre as pessoas, documenta suas tristezas, alegrias, sucessos, vitórias, mágoas, decepções, recomeço, romantismo, casamento e acasalamento...
É... o poeta, o verdadeiro, sente o seu igual e vibra com a sua existência da forma que o seu cérebro reproduz as imagens e sentimentos vindos dos recônditos da alma, de um lugar em que ninguém sabe onde é, nem ele mesmo.
O poeta vai aonde quer; Ele junta impressões e cai nas garras do mundo lúdico. Mas as garras do mundo lúdico são fortes e suaves. Elas agarram forte e empurram todos eles para a grande viagem do ser, em que cada um brinca de querer, de ter, de ser, de fazer...
Duvido que um poeta copie obras que não sejam suas, versos que não sejam seus e assine embaixo... Ah, eu duvido!
O poeta, diferente do cineasta, anda com uma idéia na cabeça, um bloco e uma pena na mão.
Desde as tábuas de argila utilizadas pelos escribas até a chegada do livro, o poeta escritor percorreu longo caminho.
Ah, mas como os tempos são outros, um computador é muito bem vindo, até mesmo os portáteis que carregam pra lá e pra cá...em qualquer lugar.
Eu duvido que um poeta esqueça da primeira professora, do primeiro amor, do primeiro beijo, do primeiro orgasmo, da primeira foto, dos jardins que colheu rosas, das árvores que subiu ou que apenas avistou...
Duvido que um poeta esqueça o lago, o rio, o mar que aprendeu a nadar ou que apenas mergulhou seus pés para sentir a temperatura e o sabor das águas quentes ou frias. Mas ele sente o sabor com os pés? Claro que sim... Duvido que não! E sabe por que? Porque o corpo do poeta é a mistura de todos os sentidos de uma só vez. Ele é tato, gosto, olfato, visão e audição. É um só pacote... É sim.
O poeta é violeiro, sem saber tocar viola;
É pintor, sem conhecer as cores primárias;
Cozinha como ninguém, mesmo sem conhecer nenhum ingrediente ou mesmo o simples endereço da cozinha.
O poeta canta, mas não conhece nenhuma nota.
Ah, "Dó" eu sinto do poeta... De "Ré" ele às vezes sai de fininho... "Mi" é um som qualquer que ele cria, licença poética, sei lá! "Fá" é o nome da primeira gatinha, da cachorrinha, da namoradinha, da professorinha, enfim... Ele inventa! "Sol" é o que o poeta mais gosta, posto que tudo que é luz representa sua arte. "Lá" é a casa da vovó, é onde existem montanhas que escondem o por do sol, é onde as luzes do céu se apagam e onde está o infinito. "Si", sinto muito, ele quase não usa... Dificilmente fala de si mesmo.
Mas continuo duvidando que ele, o Poeta, não acredite no ser humano; Que ele não dê chance às pessoas de mostrarem como são;
O poeta borda seus textos com o fio mais fino e o mais puro matiz.
Ele fala da chuva como fala de uma mulher; Avisa que no céu existem nuvens choronas que inundam a terra.; Coloca apelidos na natureza e consegue enxergar chuva de prata, brumas que envolvem o céu de um cargueiro ou pássaros que bandeiam para muitas bandas em busca de alimento ou de abrigo. Tão lindo!
Duvido que ele diga não a um apelo vindo do seu próprio coração ou do coração de alguém que sempre toca o dele.
Tudo e todos fazem parte do mundo do poeta.
Duvido que o Poeta no Dia dos Namorados, mesmo que seja em pensamento, não faça versos tocantes e cantantes que traduzam as batidas de um coração.
Do seu cantinho preferido, ele enxerga mundos infindos e escreve tudo que vê, mesmo que seu texto seja em braille.
Eu duvido que um poeta não seja um conjunto de tudo de mais bonito que o maior de todos os Poetas criou.
No momento da criação, distribuindo os diversos dons, ao criar o poeta ELE pensou: Aí vai uma parte de mim... Contarão histórias, farão viagens imaginárias, ouvirão o som do silêncio, enxergarão à escuridão e documentarão a vida, ensinando minha essência à posteridade.


Niterói/RJ, 01 de Junho de 2008.