DRIBLANDO FANTASMAS.
Se bem me lembro
E não lembro bem...
Sou esquecido...
Das coisas doces e azedas
E das amargas e doloridas também.
Lembro vagamente
Dos passos graves,
Nas calçadas molhadas,
Vomitadas,
Nas madrugadas.
 
Voltar sozinho.
Frio desgraçado,
Cigarro molhado,
Chuvisco encardido,
Fábrica de tuberculosos.
Todos os andantes da noite
Encharcados de cachaça
E de melancolia.
Distraído dos paralelepípedos
De ponta para cima, curiosos,
Zombeteiros,
Derrubando bêbados e
Velhinhas pungentes ao raiar do sol
A caminho da primeira missa.

Se bem me lembro,
E não lembro bem,
Existem prazeres
Nas mesas de canto,
No primeiro copo,
Na primeira frase,
Na tirada genial
Que anoto no guardanapo,
Que borrado de mostarda
Fica em cima da mesa.
 
Persistir na noite,
Despojado de genialidade,
Esquecido da repartição.
Poeta que busca remédio
Para as coisas do coração
Que o vai matar
Depois do fígado,
Ou do câncer de pulmão.
 
Boa noite, poeta.
Bom sono, poeta.
Descansa guerreiro.
Seus versos perdidos
Serão resgatados talvez
Das mesas dos bares,
Das latas do lixo,
Do sutiã de uma amiga.

Versos libertos, afinal,
Vagueiam no espaço
Redimem um pouco
A mediocridade dos inocentes
Que dormem o sono dos justos,
Abraçados aos travesseiros
Fofinhos, de conformismo.

Tentei evitar pisar na merda de cachorro o no vômito dos bêbados. Um chiclete mascado grudado ao meu sapato, carrega outro guardanapo boêmio pelas calçadas de Curitiba. Testemunha de meus tropeços. Meu nariz empinado rompendo a geada, altivo, rumo ao colo da amada, encontra o assaltante que o humilha, rasga o poema, deixa o dinheiro e leva o violão.
Amanhã racionalizo.
Por ora quero acabar o poema,
driblar meus fantasmas,
e dormir...