DEVAGAR NAS PEDRAS

Tantas pedras no caminho, podem levar a tropeços,
machucar os pés, travar as esperanças, impedir o progresso,
a roda do tempo se nega a girar, 
as águas que movem os moinhos levam das pedras o limo,
caem sobre as pás, jorram para o fundo e se vão com o limo de todas as boas e más lembranças.
As pedras são duras, infinitamente quietas em seu ficar,
obstruem, construem, influem,
perduram para gravar as memórias do tempo.
Nas pedras ficarão os sinais de uma época de sucessos,
e que causa tantas dores, desfaz tantos amores, exala tantos odores,
serão essas pedras, no final dos tempos, as testemunhas de cada passo de cada alma
a ser julgada pelo supremo autor
de todas as pedras e de todas os espíritos.
Nada impede às pedras a seguirem seu destino:
moídas em asfalto,
reunidas em muro,
espalhadas num campo,
incrustadas nas montanhas,
submersas nos rios e nos mares,
erguidas nos meandros e labirintos 
de paredes de templos e de aranha-céus,
adoradas como pedras da fortuna e da boa sorte,
enfeites de anéis, de brincos, ornando colares e altares
na ânsia incontida do humano coração em tê-las vivas e ativas
mas esquivando seus pés, sem tirá-las dos caminhos onde foram parar.
Das pedras a essência é sua vida eterna na eterna morte a que o criador as condenou.