o um e o outro
I.
um estica um pouco a mão, mas não muito para não parecer tolo.
está querendo forjar a impressão de que aprendeu muito nesses últimos anos, nessa última queda.
o outro se faz de desentendido, não precisa de mais nada.
está querendo forjar a impressão de que nunca foi alvejado apesar
da pressão no ombro. trata-se da mesma bala perdida que acertara um no passado.
tentam, nem sempre em vão, autoproduzir analgésicos e prometem fornecer as drágeas a quem precisar. com bula.
todavia estão num deserto, transmutaram-se nele. mais seguro e profícuo, pois. no deserto é mais difícil ser mirado. mais fácil é ser miragem.
um dia o outro faz que segura na mão do um, mas desentendem-se em suas intenções por tolices veniais. daí um foge, o outro recolhe-se e mais uma vez recorrem às drágeas. a preferida causa sensação de isolamento, sem dor.
o outro pensa que, estando sozinho, sabendo-se sozinho, na certa um sumirá do mapa como nuvem de verão.
tirá-lo do quadro da intenção já é mais difícil, pois
alguma rede sempre teima em nos agarrar no percurso da fuga.
a essa altura um já pensa que o outro está noutra e que não suportaria mais a sua presença, antes desejável, agora indefensável.
mas um dia a telepatia assusta. precipitam-se a racionalizar. cada um de seu buraco.
o outro tem certeza de que um não pretende descer do pedestal orguhoso de sua auto-suficiência ilusória, posto que é encomendada
e montada sem manual.
práticos em tudo. aprenderam a ser depois daquilo que consideram uma grande lição dada pela vida, o primeiro desamor.