Orelha do livro POESIAS DE BOLSO

Escrever é imitar a arte do camaleão. Vestir as palavras com outras significâncias, algumas que são meras desconfianças de sabê-las. Outras não passam de aromas enfeitando o ar que se respira. Tudo que inspira. Também sensação infravermelha de luz sem nome, mas clareza. Não o claro do óbvio, mas o que ofusca deixando a retina reduzida ao ponto cego. É que escrever é tato. Fechar os olhos para ver a vida em noite de alumbramento com estrelas mágicas cintilando o infinito. Escrever é tudo que ab-sinto.

Escrever é trabalho de aranha. Tecer os fios com a força dos instintos que são os brotos do pensamento num campo minado de só sinestesia orvalhada, hecatombe de arrepios sem nem palavras, só sentidos.

Escrever é carpir os gelos da alma em dias de inverno nuclear. Olhar para o alto e até deus parecer poeira, e o coração sorrir de tão desconsolado. Sentir o frio que vem dos campos de girassóis despedaçados, e dormir como os cães de rua no auge de seus abandonos. Escrever é não ter dono e ganir a solidão como um lobo das estepes.

Escrever é traduzir o som. A vibração supersônica virando palavra nascendo despenteada e com vertigens. Toda palavra é virgem quando apenas imaginada, mas nunca imagem posto que é espelho.

Escrever é tosquear o dia. Remover o excesso das horas para sacralizar o minuto onde nasce a ideia ainda vapor. Ter a paciência para o resfriamento quando vira pedra e pode ser esculpida. Se feia ou bela, só depende da janela onde poderá florir.

Escrever é um elixir que se serve com conta-gotas.

Aldo Guerra
Enviado por Aldo Guerra em 25/04/2010
Código do texto: T2218744