Acredite, escolha, fique.

Minha fragilidade, meus medos, minhas cicatrizes, me tornaram assim... um coração de arestas afiadas e planícies áridas. Um corpo que fala, sorri e anda, enquanto a alma desanda. Um espectro da pulsante alegria que fui outrora.

Tento reencontrá-la, aquela doce menina, resgatar pedaços não corrompidos por lembranças (tão tristes que sequer sou tentada a acariciá-las entre os fios da memória), mas sei que é impossível.

Voltar atrás seria tornar vã toda a dor que o conhecimento me trouxe, e quando me pergunto se preferia ser uma ignorante feliz à esta estranha em que me tornei... Finjo que não sei, mas minha veia ligeiramente dramática sussurra zombeteiramente a resposta.

Ainda assim, não me conformo, e luto e sangro e canto aos quatro ventos a sorte que tenho, e a cada dia tento extrair das pequenas alegrias a força para continuar.

Mas falta o essencial, aquele conhecimento de que alguém foi capaz de me olhar e enxergar além daquilo que decidi mostrar, e ao enxergar gostou do que viu, e ao gostar decidiu que valia a pena ficar.

O que mais dói não é saber-se incompreendida, é entender que mesmo a compreensão da totalidade de quem sou nunca foi – e ainda não é – suficiente.

Dói quando alguém diz o quanto sou maravilhosa – e incrivelmente ainda tem quem o diga – e tudo que posso pensar é: isso porque você não conheceu a melhor versão de mim. Mas não tenho mais forças ou coragem de revelar-la a ninguém pois sei que seria inútil procurar - ela não existe mais.

A única certeza da minha vida é que eu vou escolher o caminho mais difícil, dar valor às pessoas erradas, derramar-me em rios por quem não merece sequer uma lágrima, cultivar uma gentil indiferença por quem poderia me salvar desta espiral descendente de angustia e melancolia.

Este distanciamento que alguns confundem com orgulho é puro medo, esta calma, resignação, esta solidão...bom, é solidão mesmo.

Joguei fora todos meus princípios pensando que a negação deles me traria a tão sonhada aceitação, mas a única coisa que isso me trouxe foi o vazio de ver que a cada dia se dissipa um pouco da minha essência.

E é isso me assusta mais do que qualquer outra coisa.

Por isso sou tão inconstante, porque me desfaço e recomponho em pedaços a cada vez que caio, e levanto por mim mesma.

Porque assim como todo mundo sou falha, tenho minhas incertezas, minhas inseguranças, meus desejos de ser pega no colo e mimada e assegurada de que tudo vai ficar bem. Porque já amei tanto quanto se pode amar numa vida inteira, e ainda assim, quando penso que não tenho mais nada pra doar, descubro que ainda desejo terrivelmente fazer alguém feliz.

Por isso, se algum dia eu arranhar sem querer, me retrair de repente, levantar barreiras entre nós...não se ofenda - algumas feridas demoram pra cicatrizar.

Se meu olhar alternar entre alegre e triste de um segundo para outro, não se assuste, nem ligue para os momentos – raros momentos – em que eu precisar ficar sozinha.

Eu ainda estou aprendendo, mas sei que não há nada que o tempo e o amor não possam superar.

Por isso, se depois de tudo, ainda gostar do que viu...acredite, me escolha, fique.

AnyAngel
Enviado por AnyAngel em 05/10/2010
Reeditado em 04/04/2021
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