Eu quero voar

O denso da matéria me amordaça o espírito, e ainda que meu espírito fale mais alto não consegue vencer a couraça pesada que o reveste.

Uma batalha travada no dia a dia me faz oscilar entre as escolhas mundanas e o chamado melodioso do espírito.

Se de um lado o espírito me dá uma visão infinita do mundo, me promete a imortalidade da alma e a beleza só concedida aos desprendidos da matéria; o mundo táctil me faz provar o gozo imediato das relações, me faz sentir o prazer fácil das conquistas, bem como a satisfação beligerante do consumo. O mundo da matéria tem efeito passageiro, sabiamente conhecido, mas nunca é drasticamente rejeitado diante do prazer egoísta.

Por mais que eu saiba, e por mais que eu reconheça a efemeridade da matéria me vejo às voltas com a indecisão de trocar a graça, a leveza do corpo sutil pela grosseira e arrastada roupagem carnal.

Nessa luta titânica diária os anos correm sorrateiramente, tanto que quando olho meu par de olhos no espelho, percebo que seu brilho embaça juntamente com a carcaça cansada que se arrasta indefesa frente a ação irredutível do tempo.

Engana-se o insensato que ajunta riquezas tolas sem semear no seara do seu coração amor puro, incondicional, pois que a semeadura não é obrigatória, mas a colheita sim. O que sobrará sobre a terra senão carne tola para o banquete macabro?

Olho para o céu, caminho sobre a terra e meu espírito volita acima da terra batida, sempre na esperança de conquistar de vez meu mortal coração.

Nada mais me separa do ontem do que eu mesma, e nada, nada mesmo me separa do meu amanhã, senão eu mesma; em carne e osso.

Ouço acordes melodiosos como brisas roçando minha pele cansada...meus pés ainda se arrastam querendo voar...

Angélica Teresa Faiz Almstadter
Enviado por Angélica Teresa Faiz Almstadter em 06/11/2006
Reeditado em 18/05/2007
Código do texto: T283274
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