Intimidade

Intimidade requer outro tato -sutil. Demanda afinidades invadindo âmagos -ontológicas. É visão unindo focos -mesmo sabendo a divergência na representação. Quer corpos dançantes -incertos quanto ao quem comanda quem. É o terceiro -feito de dois.

Na intimidade partes minha e tua compõem o universo no qual eu não sou puro eu, nem tu és apenas tu. O “nós” é maior que as partes, embora tenha nelas a sua condição.

O trágico da intimidade é que ela exige liberdade. Não basta só um querer, desejar, necessitar...

A intimidade é sempre proposição, nunca intimação. Proposta, conduz escolhas. Imposta, aborta vontades.

Se um propõe e o outro dispõe, ela se faz.

Intimidade que intimida não nutre, aniquila. Dissimulada, desconfia. Comprada, anula. Evasiva, sangra. Invasiva, mata.

Entrega lhe é essencial: uno mundo, duplo ser.

Os limites: zelo ético, respeito e verdade.

A intimidade não aceita queixa de falta antecipada. Nem lamento no depois. A coragem de vivê-la é indispensável à experiência de poder curti-la.

Na intimidade não cabe o jogo de poder. Falar, menos o que deve ser feito. Fazer a exceção do que se diz. Meias palavras, olhar de espio, gestos mancos, teorização parcial, pressuposições, ou que o outro adivinhe nossa intenção.

Intimidade é coragem. Presença na solidão comum. Escuta a gritos há muito sufocados. Paciência no verbo obscuro. Um passo em vazios complementares. Morte das vidas vividas. Vivência das mortes de todo dia. Ouvido aos demônios de ambos. Bênção aos anjos de cada um. É partilha de vida pura, sonho franco, vinho e pão. Existência por significar.

Proponha o outro de nós, a abertura possível, a união que individualiza, o mistério que seduz. Sentimentos mesmos. Essas coisas fazem a intimidade que "intima" –irrecusável, porque nela me vejo, faço-me, me reconheço, posso ficar.