A PARTÍCULA DE DEUS

A PARTÍCULA DE DEUS
 
Leio, numa matéria do Estado de São Paulo, que alguns cientistas construíram um potente acelerador de partículas que consegue simular o momento de nascimento do universo. Ele leva a curiosidade do pensamento humano até o Big Bang, o instante em que, segundo a metáfora dos místicos cultores do moderno pensamento gnóstico, Deus se sentiu tão solitário na sua Existência Negativa que resolveu manifestar-se como Existência Positiva. Então toda sua potência acumulada, de infinita quantidade de megatons, concentrou-se num único e diminuto ponto e rompeu-se, enchendo o vazio cósmico de abençoada luz. Por isso o universo é feito de luz, como diz a Bíblia, e matéria é resultado de energia acelerada na velocidade da luz, como diz Einsten.
Ciência, filosofia, poesia. Eis a resposta do homem à missão que Deus lhe deu quando, de uma centelha dessa luz polarizada que Ele lançou no vazio cósmico, fez brotar o fenômeno da vida. Tudo isso nos diz que a resposta para as nossas especulações está no imenso do espaço cósmico e no ínfimo da materia granulada. Deus a colocou no imensamente grande e no infinitamente pequeno, para que, percorrendo as grandes distâncias possamos ampliar a qualidade e a quantidade (construindo a massa universal) e penetrando no infinitamente pequeno( desvendando o íntimo da matéria) possamos nos concentrar e arregimentar energia para construir o espírito. Assim voltamos, por exemplo a Teilhard de Chardin, que sugere ser o universo material o resultado da luz acelarada na imensidade cósmica e o espírito o resultado da energia enrolada sobre si mesma(como num núcleo de motor), concentrada em espaços infinitamente pequenos (os neurônios). 
É assim que eu me sinto quando olho para o céu e penso na imensurável dimensão do espaço que se amplia na velocidade da luz, e olho para dentro de mim mesmo e não consigo ver o meu primeiro rosto.    

             

 
Depois volto à terra e ao meu jornal. Imediatamente penso que o homem e a sua civilização caminham passo a passo. Andam juntos, par a par. Enquanto as civilizações, com o seu saber acumulado por milênios de pesquisas e descobertas científicas e metafísicas ainda não conseguiram sintetizar uma filosofia que sirva de modelo para o desenvolvimento espiritual da humanidade como um todo, alguns homens, pelo esforço individual, alcançaram um equilíbrio entre o corpo e o espírito desenvolvendo sistemas filosóficos e crenças que se transformaram em religiões. Mas suas experiências, conquanto tenham servido para moldar fórmulas de viver e pensar, ainda estão longe de satisfazer o anseio da coletividade humana por um sistema que lhe dê, finalmente, um modelo definitivo que possa levá-la a um perfeito equilíbrio entre a mente e o corpo.
Em cima da minha mesa um exemplar do livro do Dalai Lama, “A Arte da Felicidade” disputa espaço com “ Nós Mudamos o Mundo”, de Sidney Pike, livro em que o famoso executivo conta como ele e Ted Turner construíram a maior agência de notícias do mundo, a CNN.
Vejo então, que neste limiar do século XXI, ainda oscilamos entre a proposta de paz interior que a ausência do desejo traz e o sentimento de auto-estima que o sucesso na vida social nos proporciona. O Oriente, na sua procura desenfreada pela paz de espírito descobriu que o desapego aos bens do mundo pode trazer essa paz, mas a sua prática, como modelo de desenvolvimento social, mergulhou as sociedades que a adotaram na mais extrema pobreza material. Por outro lado, o Ocidente, com sua filosofia de cultivo do sucesso material superou, em várias frentes, a pobreza, mas perdeu, em troca, a paz de espírito que o desapego aos bens materiais proporciona.
Ainda bem que entre o místico idealismo do pensamento Oriental e o materialismo pragmático do ideal do Ocidente, parece surgir, no momento em que vivemos, uma tentativa de encontrar um ponto de intercessão entre esses dois sistemas de vida. É desse modo que vemos crescer no Ocidente o interesse pelas doutrinas do Oriente, particularmente o Zen Budismo e o Taoísmo, da mesma forma que no Oriente se procura, claramente, copiar o modo de vida ocidental.  
Nesse contexto, surge a pergunta: haverá mesmo uma diferença de substância entre a matéria e o espírito? Ou haverá um ponto de interseção onde as duas realidades se unem numa origem única? Se é verdade que os cientistas do átomo já estão bastante próximos de encontrar e explicar aquilo que eles chamam de “partícula de Deus”, essa partícula certamente conterá também a informação de como poderemos encontrar o equilíbrio entre o espírito e a matéria, vivendo uma vida interior sadia, e, ao mesmo tempo, usufruindo dos prazeres que a civilização, em sua marcha inexorável de descobertas e conquistas consegue nos proporcionar. Então, quando Deus nos ensinar, finalmente, como foi que Ele fez o universo, saberemos também qual a melhor fómula para viver nele e conservá-lo. Até lá só nos cabe especular, imaginar, sonhar. Sonhemos, pois, enquanto ainda há tempo.A noite, estrelada, limpa e convidativa deste primeiro dia de 2012 é uma porta aberta por onde a nossa mente escapa em busca dessas quimeras fugidias.Este ano a viagem promete.      

João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 03/01/2012
Reeditado em 05/01/2012
Código do texto: T3420189
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