Maria Bonita

Inventei um idílio, transcorrido pouco tempo, fui vitimizada por ele. Barbaramente, ainda me culparam. Era uma mulher de curvas, ora! Acusaram-me de avilanar o poema. De idólatra a iconoclasta, seria pungida de qualquer maneira. Fugi, desesperadamente de aldeões e transeuntes, que acharam natural violar-me depois do idílio. Atravessei a caatinga descalça. Não me deram alento. E assim sem sombra ou lenitivo adormeci exaurida.

Meu coração figulino sentiu inevitável remorso de não ter maus fígados. Foi então que veio atrevido um poema de amor eterno.

Não cri que me desejasse naquele estado maltrapilho, aviltou-me sua eloqüência em tantos mimos que me fez. Não tive dúvidas: passei-o no canindé. Vi escorrer-lhe o sangue dos enviesados olhos, as mãos atônitas, pasmo de ser morto assim de chofre.

Percorri os olhos pela estrada, onde nada mais acontecia. No imo peito, inumei-o. Andei chorosa por um tempo, raiva mais que culpa. Tomei um banho num rio de águas amargas, misturamos nosso fel. Saí limpa, a pele clara, os olhos claros, o sorriso exíguo. Não era mais de palavras, nem de poemas. Era uma mulher de seios, tão capaz do assassínio do poema como de comer feijão com arroz.

claudia lidroneta
Enviado por claudia lidroneta em 11/08/2012
Reeditado em 03/05/2023
Código do texto: T3825560
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.