Ou você se cala, oh você se... ode
(Apenas uma Ode de intervenção)
“Cala-te!”, ouves pronunciar desde a primeira hora, mal acabas de chegar a este mundo e, embora de inicio não te o digam talvez por seres demasiado jovem e inocente e não poderes compreender, na certa que o proferem mentalmente naquelas noites de choro em que não deixas ninguém descansar – estranha forma de agir daqueles que também vivem sem levantar a voz para os seus opressores.
Mas depois que começam a mandar-te calar, cada vez surgem mais pessoas a fazê-lo e tu começas a fundir as lágrimas com as emoções acumuladas no íntimo, de tal modo que nunca a chegas a saborear devidamente os instantes de alegria, que nascem esporadicamente e logo sucumbem, naufragados nos abismos da inútil esterilidade.
E vais-te calando a todas as investidas de uma auto intitulada “sociedade evoluída”, impostas como verdades absolutas, como se cada ser humano não fosse ele próprio único e inimitável e, por isso mesmo, merecedor de uma atenção específica.
Calas-te para poderes assimilar a importância da disciplina;
Calas-te e segues as regras da sadia convivência de mais uma serviçal ovelha;
Calas-te ante a disparidade entre a dimensão dos direitos e dos deveres;
Calas-te por ser essa a doutrina seguida pelos teus antecessores;
Calas-te mesmo que a sociedade caminhe para o retorno à escravatura;
Calas-te mesmo quando observas os atropelos que os teus semelhantes sofrem;
Calas-te mesmo que apertem em exclusivo os teus calos…
Talvez nesse instante não te contenhas e acabes por gritar, mesmo que interiormente;
Talvez até descarregues essa fúria acumulada em cima algum companheiro de infortúnio, ainda mais subserviente que tu;
Talvez a tua voz venha finalmente a ser ouvida e ganhes os teus três minutos de audiência, mas apenas como um exemplo de grande inimigo da sociedade – os bodes expiatórios são sempre convenientes aos senhores do mundo.
Poderás então falar e fazer ouvir a tua voz, mas quanto mais o fizeres, mais te irás enterrar no lodo de inimagináveis manipulações.
E quando te amordaçarem de vez, ficarás como um exemplo a nunca seguir e, mais que uns minutos de fama, ficarás para a história como um traidor da tua própria espécie.
Entretanto terás tempo para rever o teu percurso e, apesar de seguro das tuas razões, sobrarão nebulosas dúvidas para flagelar o teu espírito…
Quem segue o rebanho, há-de achar que o silêncio nunca será dourado, mas lá vai sobrevivendo – se é que isso é viver?!...
Quem levanta a sua revolta e ousa fazer ouvir a voz, pode interrogar-se qual teria sido o momento mais adequado para falar – se é que esse momento existe?!...
Quem fala por falar, procurando tendenciosamente agradar a todos, apenas falta ao respeito àquilo que representam as palavras – se é que os bobos da corte algum vez fizeram sentido?!...
Seja qual for o trilho seguido, parece claro que você – vulgar ser humano – estará sempre condenado a cair num labirinto sem qualquer escapatória e, quer na subserviência quer na revolta, o seu infortunado destino ficará definitivamente selado.
12.01.2013, ValTer Ego