Ventania

Ventania

========ErdoBastos

E ficas assim, parada, com este ar na cara.

Um ar que mostra um jeito que não te pertence,

numa cara que não parece a tua.

És uma mentira descoberta ou uma verdade

encoberta, mas não és mais tu, nem apenas

nem tão somente.

É como se tivesses vestido uma capa e nela

pretendesses te esconder da dor de ser quem és,

de saber o que sabes e sentir o que sentes.

A dor de quem fez o que fez. E sabe que fez.

E com isso, vem a dor do medo de dizer o que

pensas, de fazer o que queres.

A dor de quem é obrigada a fingir.

As vezes pra agradar e outras pra não

desagradar, apenas.

A dor da subserviência controlada pelo

interesse próprio, muitas vezes mesquinho,

sempre comesinho, miúdo.

Não há mais em ti interesses grandiosos.

Faz tempo que não te vejo querendo mudar o

mundo. Antes, te vejo mudando.

Paulatinamente e para pior, cada vez pior e

mais mesquinha, menor.

Não sei por quais dos becos escuros por onde

tua alma andou a pureza se perdeu.

Não vi em qual das encruzilhadas fizeste a

escolha do caminho que te trouxe a este ponto

da vida. Ou será da morte?

E este erro foi meu.

Cuidei tanto pra que o mundo não te

machucasse, não fosse cruel contigo...

E esqueci de te cuidar de mim.

E ventei demais perto das tuas rosas,

e as despetalei.

E esta é a minha culpa.

A culpa de ser vento forte e de andar perto

demais das tuas rosas.

E sem as pétalas coloridas que te revestiam, sem

o perfume grandioso que te guarnecia,

transfigurastes, virando nisso que agora vejo.

E que vendo, me faz sofrer tanto...

Por saber que a culpa é minha, toda minha...