Quase uma lágrima

Quase uma lágrima

================ErdoBastos

Havia um brilho molhado nos olhos dela.

Tinha pranto e tinha dor, no olhar dela quando

andava pela rua.

Vinha, visivelmente, com a alma em frangalhos,

escancarada, mostrando-se, louca pra ser vista.

Por trás daquele olhar havia uma carência

enternecedora, quase um pedido, por

compreensão, por atenção, por entendimento.

Ela queria, mas ninguém a entendia.

Queria que soubessem que sofria, queria

ser consolada. Um gesto de carinho, um afago

nos cabelos, uma demonstração qualquer de

compreensão e sua alma se acalmaria.

Andava cambaleante, como que carregando nos

ombros as dores do mundo.

Passou assim pela porta do bar onde eu

estava parado.

Nossos olhares se cruzaram por instantes, tão

rápidamente, que foi quase imperceptível.

Mas suficiente pra ficar gravado em mim.

Nunca mais esqueci o olhar e o esboço de um

sorriso em flash, uma luz fulgurante e

tão rápida, que passou tão rápido pelo sorriso

dela, mas que deixou uma impressão tão forte.

E andei até ela com a flor que roubei do vaso

e lhe entreguei.

Sem dizer palavra, só troquei a flor por um

sorriso cheio de ternura e de espanto e voltei.

Minutos depois, da porta do bar pra onde

voltara eu a vi passar do outro lado da rua.

A coluna vinha mais reta, a cabeça mais erguida

e o sorriso mais visível.

Ela parecia melhor, mais tranqüila, enquanto

tentava prender nos cabelos amarelos a flor

vermelha que eu lhe dera.

Vermelha como suas faces afogueadas pelo

encabulamento.

Vermelha como o beijo que não consegui pedir.

Juntei o amarelo do copo de cerveja aos meus

lábios vermelhos, repetindo em pensamento a

combinação de cores enquanto entrava de volta

no bar.

E agora, no meu olhar havia um brilho molhado...