Rumos e Azimutes

Venha, sigamos nessa estrada.

Logo à frente está a cachoeira para refrescarmos.

A pedra elevada que espia as orgias do sol nascente.

Pássaros que trinam composições próprias.

Fumacinha saída das chaminés;

Anúncio de comida ululante nas panelas.

Vaqueiro tangendo o rebanho.

Bovinos berrando. Equinos resfolegando.

Chuva mergulhando solo adentro.

Minhocas revirando alegremente a fertilidade.

Terra quente soltando fumaça pelas ventas.

Cheiro de mato molhado subindo.

Pá...; pá. Pá...; pá: moinho de pedra mó.

Beiju de farinha extraído do milho quebradiço.

Fubá fininho: grossura do pó.

Um tapete relvado para o corpo, estirar.

Lá é o Recanto Sossego do Matuto.

Definitivo?

Para os citadinos: enquanto as férias durar.

Legados do Casarão da Vovó

Não adorne as tesouras do madeiramento da varanda do casarão da vovó com potinhos com água açucarada para os colibris. Plante flores, aprecie um jardim, cultive um pomar, aguce o olfato para o perfume, puxe as cadeiras, exale amor, transpire sinceridade, estique as redes e espere pacientemente pelo néctar da florada, que a beleza do bater de asas desses pequenos animais notáveis de bicos finos, vêm sugá-lo naturalmente.

Desde que seja com total naturalidade, a vida de desenrola com melíferos soprares de beleza, cordialidade, gratidão, diálogo, solidariedade, respeito, fidelidade, mérito, trabalho, qualificadas associações, responsabilidade, competência, transparência, bom senso, harmonia e amizade sincera e honesta até com as serpentes e minhocas; que é a espécie que mais opera em prol do Meio Ambiente.

Com seus vestidos de chita floridos, mirando o mundo por cima dos óculos caídos sobre os narizes, pano de prato jogados nos ombros e andados de pata choca, os legados das vovós diziam isso, porém, os filhos, bisnetos, criados mudos, bibelôs e netinhos se perderam da única trilha que conduz ao ensinamentos delas; e o penalizado são os amores e zumbidos dos lindos e admiráveis beija flores.

O casarão da Vovó é logo ali, será que consigo chegar lá?

Se recordo-me bem, em algum ponto não muito longe daqui desse palmo de terra, passava um regato de água fresquinha e cristalina, onde os lambaris ziguezagueavam, as copas das árvores fechavam-se em alamedas e o relvado rasteiro era um tapete de pétalas de flores; o qual, pisávamos com cuidado para não maltratá-las. Bastante coisa foi alterada; e até os pios das corujas silenciaram.

São tantos os caminhos e desvios criados pela história durante o tempo que fiquei sem visitá-la, que tenho dúvidas de qual seguir. Era um único caminho. O tempo passa, as cataratas nas vistas aparecem e os caminhos tomam novos rumos, mas tenho certeza que o casarão do Vovó era por aqui; juro!

Devia ter pensado antes, mas agora não adianta gritar, pedir socorro, a vovó e os cães não vão me ouvir; mesmo porque, reconstruir, redemocratizar e retocar caminhos é mais difícil, que projetá-los e implantá-los! Sobretudo, segundo ouvi de vovó certa vez, até as pontes, ainda que de madeira, deveriam ser construídas para durar e não lançadas às efemeridades do imediatismo. Concluiu fazendo eu refletir que, indiferente a dureza, se o óxido das intempéries corrói o ferro; pior a madeira, que tem contra si o cupim e outros animais roedores: "contudo, meu filho de pernas longas e memória curta, águas hão de passar debaixo delas. Por isso, mantenha-se em alerta, tenha cuidado com os dilúvios que caem inesperadamente; pois a Natureza não manda recado, ou alerta prévio de suas ações".

Admito e peço desculpas pelas minhas pernas longas, com as quais transitei pelo mundo; e memória curta para praticar os legados deixados pelo seu casarão avarandado, Vovó!

Mutável Gambiarreiro
Enviado por Mutável Gambiarreiro em 14/02/2018
Reeditado em 22/02/2018
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