DISTÂNCIAS NÃO INAUGURADAS

DISTÂNCIAS NÃO INAUGURADAS

Cada vez que olho para uma distância não inaugurada, vejo o quanto de mim ainda precisa chegar. Tenho sede de fazer passado. Mas, não me esqueço do presente. É só existindo no que acredito que me componho. Não sei quanta pulsão há em mim, porém disponho meu sangue. E jamais poderia dizer as palavras que digo se um dia elas não tivessem me faltado...

Não quero plateias, embora precise de vozes individuais para constituir meus sonhos, para fazerem o coro da obra de arte considerada a pedra fundamental desta trajetória. Em coro, sem couraça. Precisarei equilibrar o momento e as pessoas que nele estiverem envolvidas. A vida é pouca para o tanto de impulsão recebida. Vontade sincrônica de partir e ficar.

Será que todo excesso de mim é sobra? Nem tudo ao alcance da minha mão é meu. As impressões digitais revelam marcas de um mundo real. Quanto já passou em minhas mãos e não peguei por estar de coração fechado. Não me culpo. Talvez não houvesse espaço por ter sido algo pequeno. Foi só então no agora que entendi o ontem. Meu desejo não era presente, mas futuro. Cansa ser imediatista. Meus ombros suportam o mundo. E o meu coração o que suporta?

Vez em quando a imprevisibilidade precisa nos guiar. A vida só tem valor no que dela ainda não se manifestou. Do contrário, já estaremos cessados. E é preciso estarmos dispostos a toda experiência sem nos preocuparmos com a durabilidade. É fundamental a busca pela paciência diante de tanta coisa que nenhuma súplica pode conquistar. Tolerar coisas, abraçar causas e causar pessoas. Precisamos beirar o limite, menos que isso não é viver. É dever de todos nós carregarmos o tanto que somos capazes, não falo de sobrecarregar, mas, sobretudo, carregar. Carregados, estaremos prontos para as lutas diárias. São condições para um crescimento consciente e sereno.

A medida da vida está para o seu intervalo. Entre o som e o silêncio. Entre um batimento e uma respiração. Entre o nascer e o pôr do sol. Entre aquilo que somos e gostaríamos de ser. No novo está o velho. No velho está o novo. Mesclar a novidade com o já conhecido faz parte dessa busca essencial de acertarmos os termos.

Tomar o tempo como aliado só é possível a partir da construção da vida como um artesão. Tudo entrelaçado. Um mosaico formado – onde nenhuma peça está deslocada. Tempo uno. Passado, presente e futuro em um único turno.

Clarice sabia que “amar os outros é a única salvação individual [...], que ninguém estará perdido se der amor e às vezes receber amor em troca”. Aos sete anos eu já entendia que a palavra não se resume a um signo, que seu significado ultrapassa o entendimento – me espantei, assim, intui o que é a poesia: um não saber, mas um sentir. Na veia veio a poesia. Venho de uma chegada e procuro uma partida. Que seja uma partida inteiramente plural.

Leo Barbosaa
Enviado por Leo Barbosaa em 17/06/2021
Código do texto: T7280699
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