A rua

Ele vinha,

Não trazia mais na bagagem o peso das coisas que levara.

As hipóteses , os sonhos eram poucos,

Quem sabe apenas a memória lhe pesasse deveras.

Trazia ali os anos, as utopias,

os olhos pesados de uma rotina distante.

Era a mesma rua, mas tudo era novo

Menos a saudade, a vida, ele.

De longe avistou a si

Correndo sobre os paralelepípedos

Sentiu os pés rachados

E alma encheu-se de nostalgia e de si.

Viu a sombra das mangueiras velhas,

Ouvi o silêncio de tempos

E sentiu o cheiro das folhas caídas

E sentiu-se cair

E sentiu-se pouco.

Avistou meninas, desejos, pecados

Juntos à tardinha, parou e chorou uma lágrima só

Deixou-a escorrer dos olhos à boca

Enquanto o céu, como se o entendesse,

Chorou uma chuvinha miúda

E todas as águas e todos os tempos

Formaram um só amargor dentro de si.

Olhou para si, menino,

entre as sensações de um mundo antigo

e um corpo artificialmente triste,

sentiu medo.

Deixou a alma banhar-se ali por um longo segundo,

Virou-se e foi embora

Para nunca mais mexer no passado.

Geovane Belo
Enviado por Geovane Belo em 08/12/2005
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