Minha Casa

O vento sopra friamente nas encostas do meu passado. Um veemente estrondo nasce a cada encontro das ondas com as rochas. Minha casa, tão próxima à encosta, é ameaçada pelo avanço das ondas, e o vento cada vez mais agressivo ameaça derrubar aquilo que levei anos para erigir.

Aqueles que enxergam minha casa ao longe cogitam sobre sua queda. Os turistas, que vislumbram meu lar apenas nas temporadas de férias, ofertam pequenas quantias na esperança de que eu entregue minha oportunidade de ver o belíssimo nascer do sol, as tartarugas marinhas surgindo das areias, bem como o brilho único das estrelas e da lua, que me presenteiam com sonhos e versos inesquecíveis.

Cresci nesta casa. Lembro-me dos sorrisos e lágrimas daqueles que ajudaram em sua construção, ainda que apontando para as ondas e o vento, argumentando que ali não era lugar adequado para sonhar.

Alguns disseram que não suportaria a solidão, e que o som desafiador das tempestades e suas grandes ondas trariam desespero e angústia.

Quando o período das tormentas cessa, muitos desejam se aproximar, e entre estes aqueles que ansiavam ver minha casa por terra. Pedem para tirar fotos e ouvir explicações sobre como aquela casa permanece de pé, ano após ano, mesmo diante de tantas intempéries.

Alguns dizem que dariam tudo para morar ali, porque a sensação é de que estão num lugar onde reina a fé e a esperança, sem espaço para o medo e a insegurança, e onde a vida brota de inúmeras formas, não somente dos ovos dos pássaros e tartarugas.

É bem verdade que há outras casas não muito distantes dali, mas nenhuma outra tem a mesma visão do horizonte, a mesma elegância da madeira cuidadosamente lapidada, além da segurança de estar edificada sobre a Rocha.

Ao longo dos anos acompanhei a ruína de casas construídas sobre a areia, lágrimas e pranto de pessoas que acreditaram na permanência de suas casas diante das tormentas.

Muitos ergueram casas vazias, desabitadas de alegria e esperança; passeando por elas, nada se ouve senão vozes do passado clamando por sobrevivência.

Não consigo me ausentar por muito tempo de minha casa. Às vezes, caminho em direção a praias mais distantes, esperando encontrar paisagens desconhecidas, expressões de vida diferentes daquelas já conhecidas.

Mas a vida não deve ser simplesmente reconhecida e admirada, mas incorporada em nossa própria existência e experiências, pois no decorrer das bonanças e tormentas, nos apoderamos da oportunidade de conhecer a vida além daquela percebida, uma vida decorrente de novos significados, apreendidos através dos relacionamentos que construímos.