OVERDOSE IV _ Um expurgo d’alma.

Existem certos momentos, em que eu vejo meu peito espremido por um aperto tão grande, que me faz perder o ar. Então, fico com um gosto de não sei o quê na boca, enquanto uma voz cadenciada fica dançando em minha mente e empurrando-me para um abismo enorme, de onde eu não sei como sair...

Nesses momentos, tudo o que eu mais queria era que o mundo parasse pra que eu pudesse saltar desse bonde.

O mais impressionante é que o antídoto para tão grande mal-estar fica a um único ai de distância. Mas, eu não posso, eu não posso, eu não posso....

O pra sempre é nada e o nada é tudo o que eu tenho, agora... Ou será para sempre?

Eu não sou cética. Eu detesto céticos! Ordinários que riem da desgraça alheia...

Pois hoje eu virei ordinária. Estou cética, cética, cética...

Um dia eu entro nesse espelho e deixo de ser reflexo. E então, canto contos, diminuo os pontos, rasgo as suturas, lambo as feridas, abafo os ais das frescuras e dou um urro pra vida.

O Sol sorri pra mim. Eu a-cre-di-to. O vento açoita minha alma. Eu creio nisso também! ¨Dias de ventos, dias de mortos...¨ Frase de Bibiana, em UM CERTO CAPITÃO RODRIGO, (da obra O Tempo e o Vento de Érico Veríssimo).

Mas, o reflexo desfaz-se nessa holografia embaçada... No espelho escorrem gotas de sangue... Assim, o espelho só consegue refletir

a partitura do descaso, da miséria, da fome, do anticristo...

No céu aquele pássaro impertinente que defecou sobre o meu braço... Eu poderia tê-lo matado, mas concluí que naquele dia, naquele exato momento, eu não passava disso: uma latrina.

Ontem, eu fiquei tão contente com aquela porta se abrindo, que por um instante até consegui fazer de conta que o tempo descansava nos ponteiros das esperas.

Mas, o relógio já não pulsa mais. E eu nem sei por quanto tempo eu fiquei ali parada. Até que percebi a fluência das cachoeiras do não posso mais...

O silêncio era mortal, mas o meu pé de alecrim ainda estava lá.

Então, o tempo parou pra me ver passar nas calçadas onde ficaram cinzeladas as marcas daqueles pés. E os meus passos... Travaram no reflexo do espelho que grita sem ser ouvido.

Onde está a verdade?

As máscaras foram todas colocadas sobre a mesa da ilusão. E ao fundo da caverna, aquelas sombras... Onde terá se escondido a verdade?

Não obstante, o pensamento socratiano sussurra para Shakespeare, que também, nada sabe sobre as filosofias existentes entre o Céu e

a Terra...

Mas, Sofia continua visitando seu esconderijo no meio do jardim, para ver se consegue acender a luz para os macacos sem roupas.

O que é ser pleno?

Talvez, seja esse caminhar sobre as sombras de outros passos. Dos mesmos passos que agora, retumbam aqui... Mas, eu não os alcancei.

Ah! Como eu queria ter asas para navegar até o fundo dos oceanos.

E lá encontrando uma sereia, tomar-lhe emprestado as nadadeiras, para rumar a esse mesmo pedacinho da via látea, onde surgiu o anjo da anunciação.

Mas, estou presa entre dois mundos, entre o fogo e as brumas de um futuro que jamais foi passado. No entanto, é presente. Está vivo!

Assim, a vida segue. Vidas... Mas, quê vida? Onde está a verdade?

Verdade, ver idade, ver a cidade, ver.

A cegueira domina a humanidade. Tudo é reflexo, ou oco...

Oco, eco, eco de nota musical. Só um eco agudo, fininho, cortante...

_ Pára quieto menino! Não grite.

Será que ele não vê que eu preciso vomitar esse conteúdo estranhíssimo que se enredou nas teias de uma masmorra ainda mais estranha?

Plantei arruda cheirosa, num vaso com alecrim...

“Não faças do amanhã o sinônimo de nunca, nem o ontem te seja o mesmo que nunca mais. Teus passos ficaram. Olhes para trás… mas vá em frente. Pois, há muitos que precisam que chegues para poderem seguir-te.” _ Charles Chaplin.

Tânia Regina Voigt
Enviado por Tânia Regina Voigt em 04/06/2009
Reeditado em 17/01/2015
Código do texto: T1632444
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