Ressurreição
Morri. Vi o meu enterro. Morri de fome e de sede. Morri de inanição. O coração enfartou. “AVC”.
Após o primeiro impacto ao ver meu corpo estendido vestido de preto e queimado de sol com meus cabelos encaracolados, perguntei-me: “O que faço aqui estendida se minha alma é radiante e tem os raios amarelos do sol”? Possuo a maresia do sorriso dos dias e das tardes, das noites estreladas e o desejo de correr pelos jardins da vida sentindo o cheiro de mato. Não. Não desejo andar pelos Jardins do Éden agora. Não é hora. Preciso voltar. Por que todos me olham e choram? Estou viva! Não me vêem? Olhem, estou aqui gente! Olhem... Olhem!
Meu sorriso cobre o Rio de Janeiro dourado, por que irá ele deitar e dormir se há toda esta cidade para iluminar? Se meus dedos buscam afoito um papel e uma caneta para escrever um poema e um palco para representar meus personagens e travestir-me de outras almas?
Mais a frente está meu chefe parado fingindo chorar. Na verdade está mesmo é preocupado e não se interessa se estou estendida neste corpo estranho: Ele quer o Relatório. O Relatório! Ainda falta a Ata. Onde está a Ata? Sei que é assim que ele deve estar pensando. Eu me esqueci de terminar as enfadonhas letrinhas finais.
Fiquei olhando-me assim sem vida e não gostei: “Esta mulher que carrega meu nome aí deitada, não sou eu”. Meu corpo nasceu para guerrear. Meu corpo nasceu para viver e lutar. Meu corpo nasceu para vencer! Não pode continuar inativo. Não existe esta mulher pálida e fria. Esta esperou que só com o seu "eu" coração pudesse alcançar a verdade e ver a harmonia no mundo. Esta esqueceu que este mundo é de guerra, é olho por olho e dente por dente, onde o mais fraco é esmagado pelo forte e o rico é cada vez mais poderoso...
É preciso empunhar a espada! O coração em uma mão e na outra a espada da Justiça!
Fiz então o enterro desta mulher inválida: Saí desse corpo e firmei-me em meu lugar. Finquei meu coração na Arte da Representação. O Palco iluminado que só me traz emoção e alegria. Agora sim: Revivo integralmente como sempre desejei. Vivo como quero.
Olho meus amigos e amigas de jornada: Todos me saúdam e brindam-me com um “Bom dia!”
Sou feliz ressuscitada. Criei um novo corpo mais possante. Mais atuante, guerreiro, valente, verdadeiro e ainda brasileiro.
Renovei-me. Sou vencedora. Dependo unicamente de mim. Amo-me.
Eu, mulher de várias faces, vivendo da aventura de ser outras pessoas, represento a arte do mundo.
Enterraram a mulher sem rosto e agora ressurge a verdadeira em franca ressurreição. Bendigo o dia de hoje. Bendigo a vida que escolhi. Agora, vivo no palco da minha imaginação.
Rose de Castro
Escritora, Ghost Writer e Poeta