O anjo bom da Bahia

Sobre os profetas e as profetisas é sabido que são homens e mulheres escolhidos por Deus, como intermediários que transmitem ao povo os seus desígnios sobre o presente e aquilo que está por vir. Além disso, o profeta faz uma profunda experiência de encontro com Deus. Por meio dessa experiência, Deus comunica de diversas maneiras, sua mensagem divina a esse homem ou mulher que ele escolheu : “Eu falei pelos profetas, multipliquei as visões” (Os 12,11); ou ainda como se percebe em no livro de Gênises: “Abrão recebeu numa visão a palavra do Senhor” (Gn 15,1).

Toda essa realidade leva o profeta a ver o extraordinário no ordinário, ele torna-se sensível a vida real que o chão para sua profecia. Pode-se arriscar dizer, que em terras brasileiras, uma profetisa chamada Dulce, com fama de “anjo bom”, foi capaz de ver o que os outros não queriam ver. Era uma assídua defensora da justiça e do menos favorecido. Uma profecia feita prática!

Sobre esta profetisa do século XX, a Dulce dos pobres, veio ao mundo em 26 de maio de 1914 no bairro do Barbalho da cidade de Salvador. No seu batismo recebeu o nome de Maria Rita Souza Brito Lopes Pontes. Seus pais eram Augusto Lopes Pontes e Dulce Maria de Souza Brito Lopes Pontes. Essa profetisa tinha uma especial predileção pelo futebol- era torcedora do Esporte Clube Ypiranga, time composto por trabalhadores e pessoas socialmente excluídas. Desde muito novinha (13 anos), por influência do pai, fez de sua residência um lugar para acolher aqueles mais necessitados da sua cidade. Sua casa ficou conhecida como “a portaria de São Francisco”. Nesse contexto, pela primeira vez, sente o desejo de dedicar-se à vida religiosa. Não passado muito tempo, tornar-se uma religiosa da Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição de Maria, assumindo o nome religioso de irmã Dulce em homenagem a sua mãe .

Como os profetas da literatura veterotestamentária, que na cotidianidade da vida enxergavam a mensagem de Deus naquilo que para os homens era desprezível (Am 3,9-11), Dulce foi sensível ao que era desprezível aos olhos da sociedade de seu tempo, os mais pobres, doentes e abandonados. Um fato marcou sua vida: “Em 1939, ocorreu o fato que definiu o futuro de sua ação social: a invasão de cinco casas, na Ilha dos Ratos, para abrigar doentes que não tinham onde ficar. Dez anos depois, Irmã Dulce ocupou, com autorização da sua superiora, o galinheiro do Convento Santo Antônio (inaugurado dois anos antes), levando para lá 70 doentes” .

Dulce não fez de sua vida religiosa uma comunhão egoísta com Deus, contudo, tal comunhão a levou para uma profunda sensibilidade social. Sua vocação foi viver o evangelho com os mais necessitados. Fez da Palavra de Deus, palavra de ânimo, coragem e conforto, em meio às dores da fome e exclusão dos inúmeros desfavorecidos das ruas de Salvador. Sua profecia feita prática, ainda hoje é viva e cuida daqueles que aos olhos de muitos são desprezíveis.