Testemunha Ocular - Uma palavrinha sobre a turnê dos Scorpions pelo Brasil

Absolutamente surpreendente o show dos Scorpions – a decana banda alemã de hard rock – ontem, no Centro de Eventos da cidade de Ponta Grossa, Paraná, antepenúltima etapa da seção brasileira da “Humanity World Tour”.

Surpreendente em primeiro lugar pela organização do evento, que soube escolher um espaço já acostumado a grandes shows nacionais nesses quase vinte anos de existência (Ivete Sangalo, Claudia Leite e outros), mas que ainda não havia tido a oportunidade de sediar um espetáculo internacional desta magnitude. Segundo pela eficiência desta organização, que com com policiamento discreto e eficaz orientou os freqüentadores até a chegada no estacionamento amplo e bem cuidado de maneira rápida e ordeira. E em terceiro lugar surpreendente pela vitalidade de uma banda que está em sua quarta década de atividades ininterruptas com qualidade sempre crescente.

E que tour esta! - cobrindo tantos pontinhos quanto se pode ver no pequeno mapa no site oficial. Mais uma vê, mostra de fôlego de Herr Meine e companhia, que encaram capitais e cidades de porte médio tocando para platéias que variam entre dez e cinqüenta mil pessoas. Com profissionalismo germânico e a dedicação dos fãs – inclusive os de nova geração, que saíram de lá dizendo ter assistido ao “melhor show de sua vida” e que “’Still Loving You’ é a ‘Stairway to Heaven’ dos anos oitenta“ – a banda vem colhendo frutos de uma tradição roqueira exemplar: a transmissão de gostos de pai para filho, haja vista a profusão de cabeças cinzas espalhadas pelas platéias, ao lado da piazada.

Ainda assim foram recebidos com a proverbial passividade paranaense, em um início morno na platéia e quente no palco. James Kottak, o baterista, finge se irritar e conclama a platéia a levantar os braços, soca o instrumento, dá uma porrada com a baqueta na caixa que a faz voar a uns três metros de altura, pegando-a de volta. Bebe cerveja e cospe tudo para cima quando retorna ao banquinho, sem dar tempo para os ouvidos. Cadê os metaleiros? Cadê a mulecada pogando?

Ponta Grossa não merece esse show, grita alguém. “Still loving you”, fala um maldito. E os caras lá, na maior simpatia, fazendo o beabá com acorde de quinta, a voz de Klaus perfeita por sobre a muralha de som puro metal: duas, três guitarras, ritmos quebrados. Rock de arena? Certamente. Populista? Popular? Certo mais uma vez. Clássico.

No set acústico, surpresas: backing vocals brasileiras ? - pelos nomes... percussão e guitarra locais. Nesta última, ninguém menos que Andréas Kisser, do Sepultura. No setlist, algumas das baladas mais matadoras do chamado lovy metal, epônimo malcriado que reúne as mais variadas manifestações do amor (ou da preguiça) metaleiros. Era o que faltava para captar a atenção da platéia heterogênea, mais acostumada a estridentes dores de corno da música breganeja.

Platéia que foi definitivamente cooptada ao término do louco show de bateria do maluco James Kottak, preparando a reentrada triunfal onde não faltaram hits – inclusive a famigerada “Still Loving You” e apelos para salvar “The Rain Forest”, ao vivo e no telão. Noves fora as imagens de ativistas do Greenpeace em protestos ao redor do globo contra empresas quem processam insumos agrícolas, carro-chefe da economia da cidade que sedia a exposição-feira agropecuária que contratou o show.

Saíram com a platéia no bolso, obedecidos em todos os rituais, cantando junto – pelo menos nos refrões – e instados sempre a tocar mais uma. “One more?”, pergunta Klaus, orquestrando uma jam meio bagunçada no (verdadeiro) final.

Um tesão! – quer expressão mais anos oitenta? Arrepiei ao ouvir a voz limpa e clara do cara não ter sofrido um arranhão nesses anos todos de estrada, cantando sucessos que estiveram, também, entre as primeiras coisas que toquei ao violão. É, aquela mesma, a famigerada (porque taaanto tocou que até enjoou) - SLY, “Rock You Like a Hurricane” e “Big City Nights”. Reunidos eu e os Beraldos no “Coquetel Molotov” (quase homônimos de uma famosa banda pré-punk paulista sem o saber) a tocamos até numa final do projeto Canta SEPAM, promovido pela escola do mesmo nome, no antigo Teatro Pax. Senti-me vingado. Lá por 84, insistíamos em tocar rock pesado quando a maioria das bandinhas de Ponta Grossa só tocavam covers de roquinhos nacionais, éramos tidos como malucos. Hoje o metal é, cada vez mais, business, onde bons produtos como a – competentíssima – banda alemã Scorpions, fazem diferença e lucro.

Parabéns pela iniciativa.

P.S. A cultura paranense deve existir além dos limites da Pedreira, do Guairão e do Positivo.

Renato van Wilpe Bach
Enviado por Renato van Wilpe Bach em 13/09/2008
Código do texto: T1176691
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