LUZES NO ESPELHO - ADÉLIA MARIA WOELLNER

“A intenção é de abrir o coração e a alma. Demonstrar que tudo é motivo de crescimento e nada é razão para abandonar a trilha da vida.” Logo no início, a escritora já confessa seu propósito: dispor de suas vivências na prosa e na poesia que tanta domina. Mostrar algumas cicatrizes e muitas conquistas.

Trinta anos de serviço na mesma empresa, um papel assinado, e uma nova janela de vida se abre. A aposentadoria não representa um fim para a autora e sim uma nova história, uma libertação dos compromissos e das normas rígidas e, certamente, a inspiração das primeiras luzes no espelho da criação. As cores fortes de algumas emoções desenham no mundo um corpo seguro e sensível, capaz de encantar os leitores com seus movimentos.

As realidades do dia-a-dia e as representações simbólicas – a prosa que narra com fidelidade as etapas da vida da mulher, tais quais são vistas no mundo, numa linguagem racional e empírica, e o espaço dos símbolos, onde a poeta envolve-nos com imagens, sons e cores, na linguagem mítica que começou a escrever como reflexo do brilho do soneto de Maria da Luz, colega de escola.

Descobre na poesia a trilha para desvendar seus caminhos. O mundo poético é o espaço em que pode se libertar dos padrões e transcender o lugar comum em busca dos verdadeiros significados. “O assunto aflora, as palavras surgem aos borbotões. Planto imagens no papel. Quantas vezes, tudo pronto, me surpreendo. Essa sou eu?”

O resgate simbólico do seu nascimento impressiona pela intensidade, o casamento, a maternidade, a separação, o recomeço, os concursos e o diploma nos prendem na narração, desejamos também nos perceber além dos diários rotineiros, desejamos ainda ser luzes e espelhos de nossas vivências.

Os tempos são costurados em retalhos. Presenciamos a infância de Adélia intercalada com a narração de seu amadurecimento como mulher, de sua barriga, de seu emprego... Viajamos em tempos distantes e conseguimos compreender a vida da autora do livro, seus relatos e suas interpretações.

Em 1960, separada e com uma filha pequena, Adélia passa no concurso da RVPSC e começa a trabalhar na Estrada de Ferro. Durante os anos de serviço, aperfeiçoa-se, forma-se em Direito e galga os cargos mais altos de empresa. Quando se aposentou foi agraciada com a comenda de mérito ferroviário, consagrando sua dedicação ao serviço.

A poesia, seu outro alicerce no mundo, também amadureceu e foi reconhecida com os diversos títulos que recebeu e com os livros que publicou.

Adélia Maria Woellner, autora do livro Luzes no espelho, é uma mulher que conseguiu superar suas circunstâncias, desafiar os preconceitos com dignidade e sempre conservar a enorme sensibilidade que a construiu com uma das grandes poetas contemporâneas.

É necessária a percepção de nossa emoção. Devemos sempre valorizar nossas conquistas, sem assumir as culpas que apenas destroem. O sentido de vitória deve ser esculpido em cada individualidade sem copiar os modelos do mundo, sem buscar nos outros as razões para os próprios infortúnios.

“Luzes no espelho” é um nítido reflexo do significado de Adélia Maria Woellner que soube reconhecer todas as possibilidades e sempre recomeçar.

A viagem literária da realidade ao simbólico me fez lembrar de um trecho do livro autobiográfico, “Os meus demônios”, de Edgar Morin: “... ninguém pode simultaneamente observar-se em pleno e viver em pleno. Às vezes, sinto a presença muito próxima do meu duplo, estranho a mim mesmo e que, no entanto, sou eu. Outras vezes, pelo contrário, sendo–me estranho, observo-me a partir do meu duplo. Reconheço no fundo de mim um abismo insondável, que, não deixando de me ser próprio, é o de cada um de nós.”

É importante se reconhecer como os degraus de acesso aos objetivos e como a paisagem possível. A descoberta de nossa pluralidade abre um novo espelho no mundo e valoriza o brilho das próprias luzes.

Helena Sut
Enviado por Helena Sut em 25/01/2005
Código do texto: T2371