Babel (Babel - Alejandro González-Iñárritu – 2006)

Babel (Babel - Alejandro González-Iñárritu – 2006)

Uma família no Marrocos consegue a duras penas um rifle para manter afastados os coiotes de suas cabras. Um casal passa um tempo no mesmo Marrocos procurando por respostas que podem ajudar a reestruturar seu relacionamento. Uma chicana cuida de dois pequenos moleques em San Diego. E uma garota surda-muda existe em Tókio.

Histórias que serão influenciadas por um ato que desencadeará toda uma série que conseqüências, que não são apenas geradas pela causa principal, mas que de uma forma ou de outra encontrarão seu ápice nesse desenrolar de acontecimentos que vistos separadamente teriam muito pouco a ver uns com os outros.

Fechando uma trilogia que se iniciou com Amores Brutos e seguido pelo ótimo 21 Gramas Babel analisa as angústias humanas. Analisa belamente essas pequenas nuances que fazem de todos nós frágeis, solitários e carentes.

O filme explicita claramente o quão carente e desejosos de atenção, carinho, sexo, compreensão nosso tempo nos faz ser, em qualquer lugar do mundo. Com uma identidade visual forte o filme se esforça para colocar todos em um mesmo plano comum, o do ser humano, evitando cair em pieguices e clichês raciais.

De um ponto de vista humanista ele põe um olhar sobre o tiro dado por um motivo banal entre duas crianças que toma proporções épicas políticas e ainda maiores no sentimento do casal. Refletindo ainda na pobre empregada do casal que não tendo opções leva as crianças para o casamento do filho no México. Cabe aqui dizer que o filme tenta suscitar um mistério, mas é tolamente desmascarado pela voz de Pitt no telefone no começo do filme.

Mas o fantástico do filme é o contraponto prestado pela personagem interpretada pela estupenda Rinko Kikuchi. Que não está no turbilhão direto criado pela conseqüência do tiro inconseqüente. Mas Chieko, surda-muda, dá o tom exato da solidão humana. Não pelo fato de não conseguir se comunicar direito, mas pelo fato de encontrar tanta incompreensão.

Seja no não entendimento de alguém sobre o quão importante é ir ao casamento do filho. Seja na compreensão que alguém está morrendo independentemente de qualquer política ou lei mundial. Talvez até na incompreensão da mecânica infantil quando um pai bate no filho por ter feito seja lá o que for. O filme é permeado de incompreensões que não afloram, mas são sentidas nas manifestações físicas dessa pequenez humana.

E que mais diz isso que uma mente excluída? Um corpo rejeitado? Onde nada mais havia de estranho do que uma simples diferença. O silêncio é muito bem colocado como superior ao barulho. Vemos constantemente a câmera do ponto de vista da jovem Chieko onde nada se ouve. Enquanto nada se ouve ela tem que conviver com seu próprio silêncio. Como cada um tenta conviver com seu próprio silencio também, mas um silencio mais difarçado, um silêncio entre entendimentos e não de fato sonoro.

Quando se diz alguma coisa e não se é entendido, esse silêncio dói mais que a falta de som. É o silêncio da distância, da incompreensão. Que lei está acima de 16 anos de amor de uma pessoa por outras? Que política está acima de um vida que se esvai lentamente? Que noticiário está acima da verdade para publicar “fatos” errados?

O filme é angustiante. Ele vai tecendo a rede de tensão e angústias de forma lenta e gradual e quando a tensão está no máximo os personagens, mostrando quão frágeis e humanos são, explodem em sua miséria e choram. O choro aqui é a válvula de escape para o inescapável. É o estopim que nos trás de volta a realidade. Ou que mostra uma realidade que tentávamos esconder. Uma realidade de conseqüências inevitáveis.

Assim com na Torre de Babel. Humanos querendo ser divinos tentam criar uma construção que alcançará o céu. O entusiasmo, a euforia, o sentimento de vida e a apreensão de terminar o feito. Onde ele é totalmente interrompido, inescapável, pela ira divina onde cada um que construía foi sumariamente condenado a falar uma língua que o outro não compreendesse. E assim a construção foi barrada.

Não creio ter sido tão repentina essa mudança, mas paremos para prestar atenção a nossa volta... Estamos no meio do caos após a ira divina. Como ateu convicto não creio em divindades nem no sobrenatural, mas essa passagem do Gênesis, assim como tantas outras, trás analogias perfeitas para a realidade. Estamos no tempo em que falamos demais e entendemos de menos.

Babel é forte e angustiante. É sobre pessoas que tem que lidar com as conseqüências, sejam elas diretas ou indiretas sobre seus atos, que nunca são atos isolados, repercutem em muito mais coisas que poderíamos vir a tentar imaginar. E por uma proximidade com a teoria do efeito borboleta podemos crer que muito mais existe entre nossa percepção e nossos atos.

Alguns detalhes do filme são puramente “filmísticos”, mas não deixa de construir fortemente para o clima total e quando vemos estamos envolvidos nas misérias ali apresentadas.

O terceiro ato do filme é realmente marcante, e muito bem fechado pelo sensível e humano tratamento que se dá a personagem nipônica. Deixando no ar o que ela teria escrito para o detetive, que deixa claro, não por si mesmo, mas pela presença que desencadeia uma clarificação na mente da jovem, que o problema não vai ser resolvido tão facilmente, como nenhum problema de tal porte é resolvido tão facilmente. Como diz que o problema da compreensão humana não vai ser resolvido facilmente. E temo uma esplendida tomada onde um abraço no silêncio, o choro pela distância, dizem muito mais que toda aquele mar de luzes, que servem a seu modo para afirmar a solidão. A pior solidão possível, a solidão no meio de todos.

leandroDiniz
Enviado por leandroDiniz em 22/01/2007
Código do texto: T355488
Classificação de conteúdo: seguro