“Jogo Duplo”

“Jogo Duplo”, primeira obra de ficção de Silio Boccanera, mistura ficção e realidade, retratando a incrível cobertura jornalística por parte de emissoras, jornais e revistas, no caso de seqüestro do embaixador do Brasil em terras libanesas. Os terroristas negociam, no decorrer da trama, em busca de um resgate milionário pela liberdade do seqüestrado.

É nesse contexto midiático que se desenvolve o enredo do livro, que tem como protagonista, um jornalista primando pela ética em sua profissão, enquanto alguns de sua equipe o desafiam constantemente, para que noticiei de forma espetacular. Assim, dá-se um sutil jogo de interesses entre jornalistas, editores, patrões, governantes e fontes de informação.

Diversos jornalistas foram enviados por suas empresas para cobrir o caso, e disputam passo-a-passo a vantagem de dar um furo jornalístico nos colegas. A partir de um furo recebido de um concorrente, Alex, personagem principal conhece uma importante fonte de informação que o levará ao delírio sensual e periculoso na mira dos terroristas. Em busca de notícias, vai se envolvendo com a uma jornalista sedutora e desvendando os mistérios da sedução e de interesses.

A história desperta no leitor, interesse e certa cumplicidade; cria questionamentos e respostas simultâneas. O interlocutor, juntamente com os personagens, trilha caminhos a um diálogo ético sobre as questões e situações cotidianas desenvolvidas em tom bem coloquial.

Ao final da trama – e no percurso – pode-se constatar a manipulação e jogo de interesses, fazendo um paralelo entre a situação apresentada no livro e emissoras de televisão e redações de jornais e revistas: as testemunhas oculares da história. Elas tudo vêem, tudo sabem e tudo informam, mas com que interesse? Até que ponto, a verdade está sendo dita? Quem apresenta a notícia, tem um compromisso ético? Ou pensa apenas em audiência e poder de seus patrões? As imagens são reais, foram colocadas em ordem cronológica, são efeitos ou se constituem mosaico? As fontes, as emissoras, os jornalistas são éticos? Os governantes governam para o povo? Até que ponto, agem corretamente ao se deixarem manipularem por situações que lhe fogem ao controle? Como o jornalista pode ser íntegro quando há pressão sobre ele (seja por ser empregado, amigo, etc.)?

O Jogo Duplo é fácil de acontecer e de viver, também. Difícil, mesmo, é continuar íntegro e coerente diante das tendências que se colocam como óbvias, porque todo mundo faz e refaz. Ser ético pessoal e profissionalmente, ao meu ver, comporta um amplo entendimento vivencial da realidade sócio-econômica e política, e saber que a transformação social só pode se dar pelo desempenho de pessoas honestas, sejam cidadãos comuns ou públicos.