TRILHA XXIX - CRUZ E SOUSA

*SONHADOR*

Por sóis, por belos sóis alvissareiros,

Nos troféus do teu Sonho irás cantando

As púrpuras romanas arrastando,

Engrinaldado de imortais loureiros.

Nobre guerreiro audaz entre os guerreiros,

Das Idéias as lanças sopesando,

Verás, a pouco e pouco, desfilando

Todos os teus desejos condoreiros...

Imaculado, sobre o lodo imundo,

Há de subir, com as vivas castidades,

Das tuas glórias o clarão profundo.

Há de subir, além de eternidades,

Diante do torvo crocitar do mundo,

Para o branco Sacrário das Saudades!

Cruz e Sousa

*ONÍRICO*

Tu que sonhaste como sonhas inda,

Seja dormindo ou na vigília séria,

Vai pr'outros mundos, foge da matéria

Com grandes asas de aparência linda,

Pela invisível amplidão não finda

Este prazer de imagem deletéria,

Somente assim, em noite de miséria

Visita dias de alegria infinda!

Vai, peregrino arcanjo atemporal,

Num voo solitário conhecer

A força volitiva do ideal

E desta forma ao ampliar o Ser

Penetra mais no Bem - maior que o Mal -

Ganhando a luz do eterno alvorecer.

Ricardo Camacho

*ELOS QUE DENIGREM*

Exalta no condor a envergadura

E o píncaro do voo em liberdade,

Louvando Víctor Hugo, e a caridade,

Os Miseráveis são a conjuntura.

Poeta dos escravos! A urna escura

Abriu-se para ti em tenra idade,

Teu grito contra a extrema crueldade

Desnuda as podres nódoas da cultura.

O sonho tenta opor-se ao pesadelo

Querendo o bem fazer à humanidade,

Porém o despertar mantém modelo

Calcado na brutal desigualdade.

Que vozes, outras, usem este apelo,

Fazendo da utopia realidade.

José Rodrigues Filho

*ANSEIO NOBRE*

Envolto em sonhos, voa, viandante,

nas asas de um assopro vespertino.

A plena liberdade, teu destino,

resplende em tua voz altissonante!

Acossa, com audácia flamejante,

os óbices do riso cristalino.

Com viva intrepidez, propaga o ensino,

que abarca o altar de iguais; intolerante!

Anseios de infindável altivez,

ao perscrutar o ocaso do viver,

granjearás, com êxito, um por vez...

E engendrarás o capital poder,

translúcida nobreza em tua tez,

alumiando o negro anoitecer!

Geisa Alves

*ANJO NOTURNO*

Ele adormece, o sonho comparece.

É noite! Entesta o breu que persevera...

Fabula num abismo a primavera,

o espírito enobrece e veste a prece.

E assim, ao ver o luto, empalidece -

olhar soturno, a lágrima que impera.

Futuro promissor, será quimera?

Jamais perdido, o instinto não falece.

A luz e a escuridão existem, sim.

O pranto deste céu imita a vida...

Luziu na tentativa, Serafim!

E novamente vai buscar a lida,

as asas doloridas - quase o fim.

Nasceu a aurora, o véu da despedida!

Janete Sales Dany

*QUIMÉRICO*

Luares perfilando o céu risonho,

Trajando nuvens plumas-algodão,

No ebúrneo sacrossanto da união

De terra e mares - fase REM do sonho,

Que vela o ser; desnuda o que é medonho,

Louvando sóis e luas, na amplidão

Da liberdade, sobre a cerração

Do mal, do pesaroso e do enfadonho.

Protege, com as asas arqueadas,

- Resguarda o bem quimérico profundo -

Utópicas venturas, ideadas...

E vai galgando céus, correndo o mundo,

Luzindo, tais estrelas prateadas

'O querubim' - plantando o amor fecundo.

Aila Brito

*ETERNO GUERREIRO*

Não foi, a tua voz, por desventura,

fadada ao som de um brado derradeiro.

Na entrega por um sonho verdadeiro

o teu legado é força e compostura.

Eis que a batalha há tempos já perdura…

Não foste tu o sonhador primeiro,

mas, sim, cumpriste a sina de um guerreiro

quando arguído em forma de tortura.

É pena que terá sempre um algoz

a condenar soldados e ideais…

Mas foste, tu, guerreiro audaz, feroz,

que te entregaste em prol dos desiguais…

O teu legado, a luta e a tua voz

gravaste bem, no livro de imortais!

Edy Soares

*A POMBA SEM TER PAZ*

Hás de voar, oh! Paz resplandecente,

buscando a luz, calor do hélio solar,

revigorante em dar-te num piscar,

o que precisas desse sol nascente.

E planas viva, em busca à chama quente,

sem nem saber se as asas vão durar

ou se serão de ceras a queimar,

trazendo assim, de vez, o teu poente...

Tua esperança voa ali também,

oh! Pomba louca para ser feliz

tentando heróica, não ser mais refém

Da nuvem densa, chuva que a ti diz

que ali, no escuro, não serás ninguém

e que esse sol nem vê teu chamariz.

Plácido Amaral

*RECADOS ONÍRICOS...*

Sonhar com os desejos do futuro

garante-me esperança cristalina.

Por vezes, desembrulho o tom menina —

em sonho se transpõe o tempo e o muro...

Mas sonho que ilumina o trecho escuro

parece voz do céu, ditando a sina.

Visão celestial que nos ensina?

Ou vestes de um pensar vivo e maduro?

O sonho que mapeia a travessia

desvenda a cena em bola de cristal —

sugere cada passo, aponta e guia...

Desenovela e esboça um ritual,

qual vida antecipada em profecia.

Tal sonho traz recado angelical!

Elvira Drummond

*A LUTA*

Volúvel é a vida e seus caminhos.

Se caso for vivida sem doçura,

Quem busca só provar a desventura

Sucumbe no amargor, procura espinhos.

Possamos adoçar os nossos ninhos

Largar de mão as glórias, por ventura,

Assim se vê valor, razão, lisura,

E liberdade igual, aos passarinhos.

Num voo singular de liberdade

Emane o grito que antes preso estava,

E faça tremular com tal vontade,

A luz encarcerada, até escrava,

Um sonho ou um clamor, a humanidade...

De quem dispõe a vida em luta brava.

Douglas Alfonso