Emprego da coação pelas forças policiais

O Estado democrático de Direito pressupõe o respeito aos direitos e garantias fundamentais do cidadão, e a manutenção da ordem pública, permitindo o desenvolvimento da sociedade, cabendo o Estado-administração responder por essa função, por meio dos órgãos policiais, que devem prestar um serviço de qualidade aos administrados, que são os destinatários desta atividade essencial para a preservação dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988, a denominada Constituição cidadã.

A manutenção da segurança pública, que é um dos aspectos da ordem pública, exige o emprego dos órgãos policiais, que são os responsáveis pela preservação da lei e da ordem em seu aspecto interno, cabendo as Forças Armadas, organizadas sob o princípio da hierarquia e da disciplina, e subordinadas ao Presidente da República, a manutenção da ordem na seara da segurança nacional, e eventualmente a preservação da ordem pública apenas nos casos expressamente estabelecidos em lei.

Não é qualquer agente público que se encontra legitimado para empregar a força, a coação administrativa direta, que tem como único fim servir a uma ordem, vencendo a desobediência, estando a disposição do poder público, que se utiliza de instrumentos legais para o seu emprego.[1] Somente os agentes policiais é que se encontram legitimados para empregar a coação administrativa direta, uso da força de modo legítimo pelo Estado, para a manutenção da ordem pública, e o cumprimento de decisões judiciais e administrativas.

No Brasil em atendimento ao art. 144, da C.F, somente os agentes públicos que integram as forças policiais previstas naquele dispositivo, é que poderão exercer as atividades de polícia judiciária ou de polícia administrativa na sua modalidade ostensiva e preventiva. Para Otto Mayer, "o uso da coação administrativa direta consiste na sua utilização pelos órgãos policiais e seus auxiliares da força destinada a assegurar o cumprimento de decisões e a manutenção da lei".[2]

O cidadão possui direitos e garantias fundamentais que lhe são outorgados pela Constituição Federal, mas essas garantias não impedem o seu cerceamento quando necessário, para a preservação da ordem, da tranqüilidade pública e da paz social. O uso da força pelos órgãos policiais serve também para combater os ataques que são dirigidos contra a Administração. Esse ataque é uma perturbação a boa ordem, a uma regra de direito.[3]

A polícia encontra-se no Estado democrático de direito legitimada para empregar a força, o que não é incompatível com os direitos assegurados ao cidadão. O Estado constitucional como observa Otto Mayer não impede o emprego da força pelos agentes policiais[4], que é essencial para a manutenção da ordem pública em seu aspecto segurança pública.

Existem circunstâncias em que a polícia necessita empregar a coação administrativa, meios que pertencem à autoridade, sem que isso venha a contrariar os preceitos previstos na Constituição Federal. Na Alemanha, a autoridade administrativa encontra-se legitimada a empregar a coação administrativa, por meio dos órgãos policiais, e o mesmo ocorre no Brasil, que não permite que outros agentes que não os integrantes das forças policiais possam atuar nas questões de segurança pública em nome do Estado.

As guardas municipais não possuem poder de polícia e seu campo de atuação encontra-se limitado à defesa e preservação do patrimônio pertencente ao Município, não se admitindo uma interpretação extensiva que o maior patrimônio daquela unidade federativa seja os munícipes. O guarda municipal poderá cercear a liberdade de um cidadão, desde que este esteja em uma situação de flagrância, uma vez que o Código de Processo Penal permite que qualquer um do povo possa fazê-lo, mas em determinadas situações somente os integrantes das forças policiais, civis ou militares, é que poderão exercer o poder de polícia na forma disciplinada em lei.

A coação administrativa direta somente torna-se ilegítima quando é empregada de forma arbitrária pelos agentes policiais, que passam a praticar atos denominados de abuso de autoridade, o que resulta em responsabilidade para o Estado. O emprego da força deve ser legítimo e estar voltado para a preservação da ordem pública e dos direitos e garantias fundamentais do cidadão, e deve ser empregado sem excessos e apenas quando necessário.

Segundo alguns estudiosos, o Estado responde até mesmo quando este é omisso no exercício de suas funções. O cidadão por força do Estatuto do Desarmamento não pode mais ter ou possuir arma. Se este se sentir lesado em razão da demora do Estado na prestação de suas funções com base na teoria do risco administrativo e com fundamento no art. 37, § 6 º, da Constituição Federal, poderá propor junto ao Poder Judiciário uma ação de indenização buscando a reparação do dano suportado. A imposição de determinadas limitações traz para a Administração Pública certos ônus que são decorrentes das funções por ela desenvolvidas, que devem estar voltadas exclusivamente para o bem estar dos brasileiros ou estrangeiros residentes no país.

--------------------------------------------------------------------

[1] MAYER, Otto. Derecho Administrativo Alemán. Buenos Aires : Editorial de Palma Bueno Aires, tomo II, 1950. p. 141.

[2] MAYER, Otto, op. cit., p. 142-143.

[3] MAYER, Otto, op. cit., p. 148.

[4] MAYER, Otto, op. cit., p. 114.

Disponível na internet: www.ibccrim.org.br, 26.04.2004.