Mandei consertar meu carro e não tenho dinheiro para pagar. A concessionária pode reter meu automóvel?

Por mais estranho que pareça, este problema pode acontecer com qualquer pessoa: mandar consertar o carro e depois, por um motivo qualquer, não poder pagar o conserto feito na concessionária/oficina/autorizada.

E aí?

O que fazer?

O STJ (Superior Tribunal de Justiça) decidiu que não é permitida retenção do automóvel como forma coercitiva de pagamento. Ou seja, não entende que há cabimento de ‘prender’ o carro do cliente que não pode honrar o compromisso de pagar o efetivo conserto.

Desta forma, a Terceira Turma do STJ, ao analisar o Recurso especial REsp 1.628.385 decidiu que a concessionária não pode reter o veículo como forma de exigir o pagamento dos reparos feitos.

A recusa em devolver o bem pode, inclusive, ensejar a propositura de ação de reintegração de posse, quando comprovado o esbulho.

Na verdade, a ideia da concessionária era reter o carro até que o proprietário quitasse os serviços.

Então, a empresa proprietária do carro, entrou com uma ação de reintegração de posse do veículo, alegando que a recusa do pagamento decorreu de divergência em relação à cobertura de garantia do fabricante.

A proprietária entendeu que o serviço estaria coberto pela garantia, mas a oficina concluiu que o defeito ocorreu devido à utilização de combustível de baixa qualidade.

Foi aí que começou a discordância e o caso chegou nos Tribunais Superiores.

O pedido de reintegração foi julgado improcedente em primeira instância — o magistrado entendeu que a retenção do veículo foi legítima, motivada pelo serviço prestado e não quitado. Contudo, o Tribunal de Justiça do Espírito Santo reconheceu a procedência da reintegração de posse e concluiu que a retenção com a finalidade de compelir o proprietário caracteriza autotutela, o que, em regra, é vedado pelo ordenamento jurídico pátrio.

No STJ, o relator do recurso especial da concessionária, ministro Villas Bôas Cueva, lembrou inicialmente que o artigo 1.219 do Código Civil — utilizado pela oficina como um dos fundamentos do recurso — dispõe sobre uma das raras hipóteses de autotutela permitidas pela legislação brasileira, qual seja, o direito de retenção decorrente da realização de benfeitorias no bem, e só pode ser invocado pelo possuidor de boa-fé.

No caso analisado, todavia, o ministro destacou que a oficina em nenhum momento exerceu a posse do bem, mas somente sua detenção, já que o veículo foi deixado na concessionária apenas para fazer reparos. Por consequência, a concessionária também não poderia exercer o direito de retenção sob a alegação de ter feito benfeitoria no veículo.

“Assim, não configurada a posse de boa-fé do veículo por parte da recorrente, mas somente sua detenção, não é lícita a retenção ao fundamento de que realizadas benfeitorias, porquanto refoge à previsão legal do artigo 1.219 do Código Civil/2002, invocado para respaldar o pleito recursal”, concluiu o relator ao negar provimento ao recurso especial da concessionária.

Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.